Nesta terça-feira (10), em sessão plenária na sede do Conselho Estadual de Cultura da Bahia, artistas, produtores culturais e representantes de órgãos fiscalizadores discutiram a criminalização de espaços negros de cultura no Estado e no País.
Artistas discutem criminalização de espaços culturais negros
Em entrevista exclusiva aoTerra, Nelson Maca, professor da Universidade da Católica do Salvador, membro titular do Conselho de Cultura da Bahia, ativista e articulador do coletivo Blackitude: vozes negras da Bahia, comentou as operações e explicou os objetivos da reunião desta terça-feira.
No dia 9 de agosto, o Sankofa African Bar, localizado no centro histórico de Salvador, teve toda a sua aparelhagem de som apreendida por agentes da Sucom acompanhados de um grupo de oito policiais armados, sob a acusação de falta de alvará sonoro e desrespeito ao limite de volume de som estabelecido por lei. Segundo Nelson, o procedimento de fiscalização é comum em qualquer bar e se deu de maneira pacífica, devido à tranquilidade dos presentes diante da situação. “O que eu acho violento é vir um homem da prefeitura acompanhado de policiais fortemente armados contra um bar inofensivo”, afirmou.
Para Nelson, a presença de um representante da entidade já seria suficiente para agir no local que sedia o tradicional Sarau Bem Black e também seminários, festas, shows, lançamentos de livros, oficinas e cursos, recebendo visitantes do mundo todo. “Será que precisa (de reforço policial)? Não é ponto de drogas, ou de prostituição. Não é caso de polícia. Tantos crimes acontecendo”, disse.
Após a operação, que aconteceu de forma semelhante no Bar do Fua, artistas e grupos culturais de dentro e de fora da Bahia se mobilizaram nas redes sociais, divulgando imagens com apoio ao Sankofa e uma mensagem construída coletivamente contra a criminalização de espaços negros de cultura.
No dia 19 agosto, um sarau foi realizado em frente ao bar autuado, em uma manifestação de resistência. A polícia chegou a passar pelo local, mas não houve problemas. O estabelecimento segue aberto, apesar da ausência da aparelhagem de som. Ainda assim, os integrantes do movimento decidiram que passarão a promover diversos saraus na rua.
Nelson Maca esclareceu que a apreensão no bar foi apenas o “estopim” de uma insatisfação antiga e remete a práticas históricas de opressão à cultura negra. “O que a gente contesta é o tipo de abordagem que foi feita”, explicou.
O professor universitário afirma que outros espaços negros também têm sido tratados como se as atividades ali desenvolvidas fossem criminosas. “É comum a prefeitura demolir espaços de candomblé. Será que demoliria uma Igreja Católica, ou Batista?”, questionou. “Isso não é de agora. Antigamente, o candomblé tinha que pedir autorização para funcionar, hoje continua. Havia perseguição à capoeira e aos terreiros de samba também. O que acontece no Sankofa não é algo isolado, é uma política formada para coibir o que fazemos. Isso, durante o período da escravidão, era feito para a gente não se encontrar”, lembrou. O ativista afirmou ainda que, caso a ação fosse realizada em um local frequentado por pessoas despolitizadas, a repercussão seria mínima e o fato passaria despercebido.
De acordo com Nelson, que participa do debate na condição de conselheiro de cultura e de representante do movimento Reação Sankofa, o objetivo da reunião é entender o porquê do uso de suporte policial ostensivo nas ações de fiscalização realizadas em espaços negros de cultura, discutir as leis que amparam tais operações e definir possibilidades de negociação.
A lista de participantes convidados pelo Conselho Estadual de Cultura da Bahia inclui pessoas que enfrentaram situações semelhantes à do Sankofa, artistas e representantes da sociedade civil, da Sucom, da Secretaria de Segurança Pública e da Secretaria de Cultura. Após a deliberação, um documento será produzido e referendado, para que o conselho possa se posicionar.
Em nota, a Sucom afirmou que a operação de combate à poluição sonora no Pelourinho foi realizada atendendo a denúncias de moradores: “ficou constatada a ausência de alvará sonoro (documento exigido pela lei 5354/1998, no artigo 6º) e o nível de decibéis emitidos pelo som do bar estava acima dos índices estabelecidos em lei. O estabelecimento foi multado (autos de infração 192155/SAS e 192156/NAL) e o som, apreendido - sanções previstas na mesma lei”.
Fonte: Portal Terra
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