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terça-feira, 15 de novembro de 2011

Caiçara canta seu povo



Rosa Minine

Nascido e criado em Paraty, litoral do estado do Rio de Janeiro, o caiçara Luiz Perequê, compositor, cantor e violonista, é um dos mais valentes na briga pela integridade da cultura desse pedaço de Brasil. Criador do Silo Cultural , que gerou a Rede Caiçara de Cultura , Perequê luta para fortalecer a cultura da região e coloca sua música a serviço de seu povo.

— Sou filho de uma família mineira que veio para cá em 1958. Meu pai foi morar na zona rural de Paraty e trabalhar com tropa, fazendo transporte de coisas entre a cidade e Ubatuba. Assim, cresci nesse universo aconchegante de belas praias e povo acolhedor, o que acabou refletindo em todo o meu trabalho de música — revela Perequê.

— Não tive formação musical acadêmica, aprendi vendo as pessoas tocar. Comecei a compor com 18 anos, e fui mostrando para alguns amigos que diziam gostar, o que me animava a continuar. Aos 20, ganhei meu primeiro violão, e dois anos depois estava participando de um festival de música em Angra dos Reis, aqui perto. Foi nesse momento que descobri que esta seria minha profissão — lembra.

Perequê diz que não se preocupa em fazer música regional quando vai compor, mas acaba fazendo, porque isso está dentro dele.

Sou daqui, gosto daqui e sigo os costumes do meu povo. É claro que isso tinha que aparecer no meu trabalho — declara.

O título Cultura Caiçara, segundo Perequê, foi dado à cultura da sua região há cerca de vinte e cinco anos, depois que um grupo de pesquisadores dedicaram-se a investigar hábitos e costumes locais.

— Descobriu-se que existe um povo em uma área que abrange a baia da Ilha Grande até Paranaguá, com seus próprios costumes, sua própria música, seu jeito de pescar, de fazer o remo, sua comida, etc. E juntando esses fragmentos deu-se o nome de cultura caiçara — explica.

— O Caiçara é o povo do litoral que planta e pesca. É o pescador artesanal, que também tem a sua pequena plantação, servindo para sua sobrevivência. Normalmente tem um mandiocal, para fazer farinha, e uma canoa, que usa para pescar. Vive em uma casa de pau-a-pique, com chão batido e fogão de lenha. É uma espécie de 'caipira do litoral', entretanto, de uma área específica — acrescenta.

— A nossa ciranda, o nosso fandango, só existem aqui. Também a nossa farinha, o nosso peixe com banana só tem aqui. Além do nosso artesanato e tudo mais que representa bem esse pedaço de terra, da mesma forma que vemos em outras regiões brasileiras, cada uma com a sua particularidade, a chamada 'cultura regional', que é a alma do povo de cada lugar — continua.

Luiz Perequê lembra que a região fez parte do começo do Brasil Colônia, e nela está bem forte a mistura índio/português/negro.

— Tivemos a chegada dos portugueses por aqui, expandindo depois para o Vale do Paraíba, e a vinda dos africanos. Então se vamos até a ponta do Cajaíba ou da Juatinga, encontramos meninos de olhos azuis. Chega em Ponta Negra e já encontra o índio, anda mais um pouco, em Campinho tem um quilombo — fala.

— Essa região sofreu por muitos anos de um total abandono, um verdadeiro isolamento do resto do país. Só com a construção da rodovia Rio-Santos é que o resto do país teve a oportunidade de conhecer. E saiu do zero ao cem: a região passou a ser conhecida como área turística, atraindo gente de todo tipo para cá — acrescenta.

Rede em favor da cultura

Mas esse turismo todo também trouxe problemas, com o desrespeito da cultura local, a especulação imobiliária e outras agressões ao povo. Para lutar contra isso Luiz Perequê, juntamente com outros interessados, criou em 2000, o Silo Cultural.

— Dentro do Silo criamos a Rede Caiçara de Cultura, junto com Antônio Carlos Diegues e outros pesquisadores ligados a USP, e começamos a fazer encontros e debates. Por exemplo, colocamos em uma mesma mesa um tocador de rabeca lá do extremo da costeira, do fundo do mato, e um acadêmico, para discutir cultura, ecologia, e falar da questão da sobrevivência. E isso é muito enriquecedor — garante .

Perequê diz que vive em uma região turística onde se fala em respeitar o meio ambiente, fazendo reservas, mas se esquece do povo que mora dentro dessas reservas.

— Na verdade, essas pessoas não foram morar nas reservas, e sim as reservas é que foram morar nas pessoas. Isso porque chega-se em uma vila de pescadores, que já existe há 300 anos e a transforma em reserva. Mas se esquecem das pessoas que moram ali, e passam por cima dos seus costumes e tudo que faz parte da sua existência — constata.

— Logo em seguida vem o turismo, que também já não respeita nada do dia-a-dia dessa cultura local, e até insere os seus jeitos. É contra tudo isso que lutamos com a Rede Caiçara de Cultura. O que queremos é fortalecer nossa cultura para poder receber os turistas, sem danos. Até porque ele é uma pessoa que vem para saber como eu vivo e tem que respeitar o meu jeito — diz.

Outro problema são pessoas que chegam atraídas pela ilusão de enriquecer com o turismo, e acabam causando o aparecimento de criança abandonadas no local, mendigos.

— Muita gente vem para cá pensando que aqui é uma 'mina de dinheiro', e não sabem eles que a 'mina de dinheiro' daqui é só para o grupo empresarial que explora o turismo e que, muitas vezes, não está nem um pouco preocupado com a questão cultural, muito menos com o povo — fala.

— E quem ganha dinheiro com turismo aqui não entende que existem as baixas temporadas, que é uma espécie de defeso cultural, o momento em que a comunidade trabalha para si própria, para produzir cultura, porque na alta temporada o turista está consumindo essa cultura produzida. — acrescenta.

Segundo Perequê o defeso cultural é exatamente a hora em que a comunidade se volta para fazer o exercício das suas manifestações artísticas, de onde surge os produtos culturais.

— Ele deve ser respeitado. É um momento de criação, de reflexão. Mas o empresário não pode ficar um dia sem ganhar dinheiro e explora o local até esgotá-lo. Costumo dizer que ao não se respeitar esse momento, se está dando um tiro nos próprios pés. As pessoas na verdade não estão 'bebendo a água da fonte', e sim 'tomando banho na fonte'. Automaticamente, essa nascente será prejudicada, começará cair areia e de repente terá uma poça de lama — compara.

— Isso acontece porque o empresário não veio para cá porque se apaixonou por algo aqui, e sim por ser um bom negócio. Ele nem sequer sofre com isso tudo, pois vai embora assim que esgotar toda a fonte, para fazer o mesmo em outro lugar. Com certeza na hora que ele olhar para a nascente e ela for uma poça de lama, ele vende tudo e vai fazer lama em outro lugar — acrescenta.

— Basicamente, a minha luta é para que isso não aconteça: canto, denuncio, uso a minha música a serviço do nosso povo. E ao mesmo tempo vou sobrevivendo com ela e com meu trabalho de compositor — diz Luiz Perequê, que é bastante conhecido na região, fazendo shows em toda parte, em muitos lugares do país.

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