Luciano Rezende *
A revista Veja faz jus a oposição que recebe dos democratas brasileiros que a acusam de golpista, pois do ponto de vista político o semanário é abertamente pró-imperialista e não se acanha em lançar mão dos métodos mais abjetos para desestabilizar governos progressistas como o da presidente Dilma. Mas não se pode negar a qualidade de várias de suas matérias, em diversos temas.
Feita esta ressalva, é digna de citação a excelente reportagem sobre o sistema educacional chinês, na edição do dia 21 de dezembro, que numa destas contradições existentes no seio da burguesia coloca o país socialista como um exemplo a ser seguido. Com algumas ressalvas pontuais, assino embaixo.
A campanha dos movimentos sociais, especialmente o estudantil, que reivindica do governo brasileiro a destinação de 10% do Produto Interno Bruto para a Educação é bandeira justa. Porém, apenas ampliar investimentos e não se patrocinar uma profunda reforma educacional, capaz de otimizar a aplicação destes recursos, não nos fará avançar no ritmo que exige o nosso crescimento econômico. A sexta economia do mundo não pode aceitar a 54ª posição entre 65 países avaliados pelo Programa Internacional de Avaliação de Alunos (Pisa), que mede a qualidade do ensino. A China (Xangai) aparece em primeiro lugar geral mesmo investindo apenas 3,6% do seu PIB em educação!
A reportagem é relativamente densa e aborda temas que em nosso país ainda são vistos como tabus. Enquanto no Brasil uma corrente pedagógica insiste em tratar alunos carentes simplesmente como ‘oprimidos’ - sem ao menos lutar por uma política permanente de assistência estudantil capaz de nivelar minimamente as condições de estudos para todos -, o sistema educacional chinês é baseado no mérito e há cobranças por resultados. No final do ano o aluno chinês, pobre ou rico, sabe que não poderá contar com a benevolência de um Conselho de Classe que o aprovará automaticamente, a fim de se evitar que sua escola receba menos recursos dos governos, como ocorre sistematicamente no Brasil.
Outro aspecto que merece menção é o binômio eficiência/simplicidade das escolas chinesas. Uma sala-de-aula limpa e silenciosa, uma bandeira nacional acima da lousa, um projetor de multimídia, professores qualificados ministrando aulas e cumprindo todo o conteúdo programático do ano são os “segredos” do sucesso chinês. Nenhuma pirotecnia.
Diferentemente do Brasil em que mestrado e doutorado são concebidos como a forma exclusiva de qualificação docente e a única opção de ascensão salarial para os professores (mesmo para os que não têm nenhuma afinidade com a pesquisa ou aqueles em final de carreira que são forçados a fazerem doutorado para tão-somente se aposentarem com um salário mais digno), a China investe também na preparação dos professores voltado para a sala-de-aula como formação continuada.
Claro que o aspecto cultural é muito importante. “Se raramente um aluno falta, um professor, nunca”. Até a famosa chamada é evitada de ser feita pelos professores chineses que se preocupam em evitar perder valiosos minutos de aula. Ninguém chega atrasado. Não têm ilusão de que o aprendizado é mais uma questão de “inspiração” do que “transpiração”.
Avançamos muito nos últimos governos em relação ao aumento de vagas e matrículas e o Plano Nacional de Educação 2011-2020 aponta para metas ainda mais audaciosas neste sentido. Mas o grande desafio que se apresenta na atualidade é a qualidade do ensino.
O crime cada vez mais comum de se permitir que jovens brasileiros cheguem até o ensino médio sem saber ler e escrever deve ser combatido tenazmente. Saber assinar o nome não pode ser computado como “aluno alfabetizado” e nem estrar nas estatísticas oficiais como número a ser comemorado. A partir do momento em que o Estado oferece mais condições de estudo, deve-se também cobrar mais resultados (que deve ir além daqueles propostos pelo Índice de Desenvolvimento da Educação Básica) de todos os segmentos.
A China superou muitos tabus. Seremos capazes de superar os nossos também?
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