Jorge Amado foi e continua a ser o escritor brasileiro numero um na Rússia. Para muitos, ele é a própria literatura brasileira. As suas obras entraram para o contexto da literatura russa soviética e tornaram-se parte inseparável dela.
Por Elena Beliakova, na Gazeta Russa
Escritor brasileiro ganhou fama na Rússia por proporcionar aos leitores temas que inexistiam na literatura soviética. Foto: Iakov Berliner/RIA Nóvosti
“Semelhante a uma rajada de vento tropical, abateu-se sobre nós a vida misteriosa de um país longínquo do Novo Mundo, cujas tempestades e paixões são, literalmente, de tirar o fôlego de qualquer um”, descreve Vera Kuteichtikova, renomada pesquisadora da obra de Amado, sobre o primeiro livro de Jorge traduzido para russo.
Sem dúvida, suas obras começaram a ser traduzidas por corresponderem às exigências ideológicas mais rígidas da época. Membro do Comitê Central do Partido Comunista do Brasil, redator-chefe do jornal do partido “Hoje” e dirigente do Instituto de relações culturais com a URSS, Amado tornou-se um importante ativista não só do movimento comunista brasileiro, mas internacional.
Durante a União Soviética, Amado jamais foi criticado. Nunca se comentou sobre suas divergências com a política da URSS e os críticos se encantavam com ele. No entanto, a afeição dos leitores comuns não surgiu por causa de afiliações políticas. Seu romance “Seara Vermelha”, presente em todas as bibliotecas rurais naquela época, foi o livro mais lido entre todas as obras de autores estrangeiros.
Para os leitores soviéticos da época, grande parte dos quais originários do campo, os destinos dos heróis propostos por Amado encontravam admiração. As pessoas que viveram a coletivização e a fome nos anos 1930, os terríveis anos de guerra e a destruição do pós-guerra, receberam “Seara Vermelha” como um livro sobre sua própria vida. Encontravam nele algo que não havia e não poderia haver na literatura soviética.
Em 1945, no 2° Congresso dos Escritores Soviéticos, Amado chegou a dizer que o principal defeito da literatura soviética era a falta de atenção aos sentimentos humanos. No entanto, o menosprezo por determinados sentimentos não é uma característica única da literatura soviética, mas da literatura russa como um todo.
A célebre frase de Tolstói “todas as famílias felizes são igualmente felizes” já dizia muito sobre isso. Os leitores queriam ler sobre amores trágicos, não correspondidos e realizados, mas também sobre o amor que vence e supera tudo.
Nos romances de Amado, os russos puderam ouvir os sinos radiantes de amor ardente e puro, que traz inesgotáveis alegrias e regozijo da alma. Por isso, suas obras foram aceitas na Rússia e nelas os russos descobriram aquilo que lhe é característico: amor à liberdade, grandiosidade da alma, humanidade, fé e, sobretudo, a alegria de viver.
Acostumados a encarar a vida de maneira trágica, parecia ainda mais difícil para os russos ser otimista quando se tinha diante do olhos, ao longo de sete meses do ano, uma planície infinita coberta de gelo e sem único dia de sol. Nesse contexto, os romances de Amado regeneram o cotidiano e, como um antídoto, conferiram leveza e harmonia a um mundo tão cinzento.
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