Rosa Minine
O pernambucano Marco César é bandolinista. Seu trabalho na frente cultural diz respeito à educação musical para o povo nordestino, tendo como base a pluralidade de gêneros e ritmos. Inclui o choro — gênero apreciado por Marco como primeira grandeza da música genuinamente nacional, e que ultrapassa as fronteiras dos estados brasileiros — o samba, igualmente representante da cultura popular do Brasil, ritmos nordestinos por excelência como o frevo de rua, o frevo canção e o frevo de bloco; o maracatu de baque solto e o maracatu de baque virado; caboclinhos; ciranda; baião e toadas. Marco procura desenvolver um trabalho de pesquisa e valorização da música brasileira e em especial da música do Nordeste.
Professor de música, instrumentista, arranjador, compositor, além de diretor musical e artístico de grupos e eventos, Marco César é um dos mais importantes artistas do Nordeste. Como professor realiza um trabalho, considerado pioneiro no Brasil, na formação e profissionalização de músicos de cordas dedilhadas; formatação de um programa didático/pedagógico de ensino de bandolim, cavaquinho e violão de sete cordas, com orientação e inserção voltada para a formação profissional mesmo, sem qualquer conotação com as terminologias gerenciais. Marco leciona no Conservatório Pernambucano de Música, Recife; no Centro Federal de Educação Tecnológica, Pesqueira; no Centro de Educação Musical de Olinda; além de manter uma sala particular em Recife para atendimento à demanda de alunos que não tiveram acesso às escolas públicas.
Já foi membro de vários grupos instrumentais no Recife, entre eles: o Conjunto Pernambucano de Choro; Orquestra de Cordas Dedi-lhadas de Pernambuco; Oficina de Cordas do Recife; Coral Edgard Moraes; Sexteto Capibaribe e Orquestra Retratos do Nordeste.
Nos contou Marco:
— Música brasileira para o mundo, me apresentei em Cuba, com o Sexteto Capibaribe; em Portugal, com a Orquestra de Cordas Dedilhadas e na França, no Festival de Avyon, com o músico e ator Antonio Nóbrega...
No papel de arranjador e compositor, tem várias músicas gravadas, entre elas: Na Porta do Banheiro, em parceria com Elizardo de Oliveira — o Bila do Cavaco — gravada pelo conjunto Abraçando Jacaré, do Rio de Janeiro; e Mais Sim...! em parceria com Ivanildo Maciel, gravada pelo conjunto Os 4 a Zero, de São Paulo. Também tem realizado trabalhos de arranjo para orquestras de frevos dos festivais; conjuntos de choro; quartetos de cordas, madeiras; metais; grupos de samba e grupos de cordas dedilhadas.
Como diretor musical e artístico de grupos e eventos, já dirigiu diversas gravações musicais em Recife, entre elas: o espetáculo Acordes pra Jacaré, em homenagem ao cavaquinista Jacaré, e outro em homenagem ao violonista Francisco Soares de Araújo, o Canhoto da Paraíba; e o CD do coral Edgard Moraes.
— Este CD, segundo alguns músicos do Rio de Janeiro, está sendo pesquisado como fonte de inspiração para a volta dos grupos de ranchos do carnaval carioca —, declara Marco César. Marco estudou música com licenciatura e participou de oficinas de capacitação em canto, técnica vocal, prática de instrumento, arranjo, instrumentação, harmonia, improvisação, composição, regência de coro, palestras, concerto-aula e apreciação musical. Teoria, solfejo e percepção, estudou com o professor Severino Revoredo do CPM — Conservatório Pernambucano de Música, e harmonia tradicional, contra-ponto e fuga com Manoel Nascimento, músico da Orquestra Sinfônica do Recife e professor do Centro de Criatividade Musical da cidade.
Amor pelo choro
Marco César de Oliveira Brito nasceu em 30 de Julho de 1960, na cidade de Pesqueira, região agreste de Pernambuco, e com aproximadamente 11 anos de idade já demonstrava interessar-se por música. Por essa época, grandes nomes do choro frenquentavam sua residência, como o violonista Canhoto da Paraíba e o bandolinista Rossini Ferreira.
Nos contou Marco:
— O meu pai, Manoel Xavier de Brito, mais conhecido como Tosinho, tocava violão de sete cordas e tinha uma relação de amizade muito grande com o meio artístico de Pernambuco e do Brasil, tendo sido elogiado pelo acordeonista Orlando Silveira e por Jacob do Bandolim, que em gravação caseira afirma ter gostado muito de ouvi-lo.
Iniciou sua carreira de músico aos 13 anos de idade, quando apresentou-se com um violão de sete cordas, juntamente com seu irmão Múcio Fernando, que tocava bandolim, no programa Recife dos Serões e Serenatas, apresentado por Jaime Ubiratan, na TV Universitária do Recife, mas acabou trocando o seu instrumento pelo bandolim e com ele se profissionalizando.
Estudou bandolim com os professores Evandro do Bandolim, Rossini Ferreira, Joel do Nascimento e Elismar Pontes. Mas costuma dizer que o seu mestre maior foi o músico Jacob do Bandolim por ouvir, diariamente, suas gravações, aprendendo com elas a frasear e a interpretar o choro, gênero musical que faz parte da sua vida, como uma das suas maiores paixões.
— Vivo, respiro, curto e amo o choro. Ele é a base da minha vida musical e devo a ele todo o meu conhecimento. Me lembro que, quando era criança, costumava escutar choro e a me perguntar o porquê de não existir escolas de música brasileira. Sentia muita dificuldade em assimilar o que havia nas gravações, faltando conhecimento musical, técnico e histórico para poder atingir um nível satisfatório. A única saída foi abordar os grandes músicos que passavam pelo Recife — comenta.
E fala com um certo carinho:
— Considero a escola do choro como a base de tudo o que se quiser seguir na música. Ele é a nossa música popular de câmara, de técnica, de fraseado, de sentimento, de improvisação, de forma, de estética, de poesia, de representatividade da cultura brasileira. Sempre me senti muito bem ouvindo choro, ao lado daquele que foi o meu maior incentivador: meu pai.
O frevo sobrevive
— Além do choro, tenho atuado com ritmos diversos, como: frevo de rua; frevo canção; frevo de bloco; maracatu de baque solto; maracatu de baque virado; caboclinhos; ciranda; baião; samba; valsa; toada; concertos de Vivaldi; Radamés Gnattali; Beethoven, sempre dando preferência para a música cultural brasileira — explica.
Assim como o choro e outros gêneros musicais nacionais, o frevo, que nasceu e vive no Nordeste do país, vem lutando para não morrer, o que não está sendo fácil.
— Existe uma lei municipal no Recife de realização obrigatória do Festival Anual de Frevos, mas a política cultural da cidade deveria enfatizar e valorizá-lo mais, fazendo-o tocar o ano todo nas emissoras de televisão e rádio. O massacre maior que sofremos, atualmente, é a presença da música brega, a dos grupos que se apresentam com indumentárias tão transparentes e abertas que nos permite ver os úteros e os fetos das bailarinas deles — protesta.
— Além disso — nota o mestre — observamos que os compositores de frevo de antigamente eram mais cuidadosos com a poesia, o arranjo e a melodia, e eram músicos com larga experiência, salvo raras exceções. Hoje, têm surgido grandes compositores, arranjadores e interpretes, mas muitos deles necessitam aprofundar os seus conhecimentos musicais.
— O frevo sofreu transformação na Bahia com a música do Trio Elétrico de Armandinho, Dodô e Osmar. Consistiu da necessidade de apresentá-lo num caminhão de som, com instrumentos típicos do frevo pernambucano, metais e palhetas. Tal foi a carência desses músicos que se criou a música baiana com um ritmo mais acelerado, tocado por pau-elétrico e posteriormente “guitarra baiana”... O frevo baiano difere do pernambucano no andamento, nas frases e no instrumental — acrescenta.
Para Marco, o frevo é uma música verdadeiramente nordestina, mas que não representa inteiramente o Nordeste, pela variedade de gêneros existentes na região, mas que, sem dúvida, representa Pernambuco.
— Da Bahia ao Maranhão, são inúmeras as representações e manifestações culturais, tanto na dança, como na arte plástica e na música. Eu o considero como uma música representativa de Pernambuco e especificamente do Recife. Basta salientar que o frevo de bloco é um gênero musical tocado e cantado somente no Recife e nas prévias carnavalescas. A dança do frevo, ‘O passo’, só existe aqui.
O encontro de Marco com o frevo também é de longa data, tendo como um primeiro mestre, novamente, o músico Jacob do Bandolim:
— As suas gravações me fizeram gostar de frevo, contudo, passei a me interessar mais pelo assunto quando comecei a namorar minha esposa, Valéria Moraes, neta de um dos maiores compositores de frevo de bloco de todos os tempos: o maestro Edgard Moraes.
Edgard Moraes foi um dos mais importantes autores de frevo, entre os quais está a marcha Valores do passado, de 1963, que inspirou a criação do Bloco da Saudade, no Recife. A marcha é uma homenagem aos 24 blocos do carnaval da cidade, que se encontravam extintos na época. Nascido em Recife, em 1904, Edgard foi responsável pela criação de muitos blocos carnavalescos em Pernambuco. Na obra que deixou estão cerca de trezentas composições, entre frevos, em sua maioria, choros e valsas. Faleceu, em 1974, algumas semanas após o primeiro desfile do Bloco da Saudade.
Outros importantes nomes do frevo de bloco foram: Raul Moraes e Getúlio Cavalcanti. Nascido em 1891, em Recife, Raul era irmão mais velho de Edgard Moraes, com quem participou de diversos blocos, executando ao bandolim as mais belas páginas do ritmo. Começou sua carreira de músico como pianista tocando em casas de espetáculos do Recife. Mais tarde, trabalhou como maestro na Rádio Clube de Pernambuco e regeu orquestras e blocos. Faleceu em 1937, com apenas 46 anos, depois de ter sido chamado de Príncipe das Marchas de Bloco, pelo carnaval pernambucano. Getúlio Cavalcanti, compositor em atividade, nasceu em 1942. Compondo desde menino, é autor de famosas músicas do carnaval de Pernambuco como: Último regresso e Boi castanho. Violonista, participa, todos os anos, da Banda da Saudade.
Ainda em Pernambuco
— No Recife e em Olinda, existe um maravilhoso carnaval de rua, com orquestras no chão, subindo e descendo ladeiras, blocos de pau e cordas, maracatus, blocos de frevos, troças, ursos, caboclinhos, etc. No passado, os grupos de choro eram chamados de grupos de pau e cordas, formados por violão, cavaquinho e flauta, instrumento que apesar de ser de metal é considerado da família das madeiras, porque era confeccionado de ébano. A Orquestra de Pau e Cordas é formada por conjuntos de choro e instrumentistas de sopro e percussão — conta Marco.
Marco César recorda que, devido à grande multidão de foliões:
— A agremiação Galo da Madrugada, atualmente, usa cerca de vinte trios elétricos, com orquestras de frevos e conjuntos musicais. Tive a oportunidade de sair no Bloco das Ilusões, que é vinculado ao Galo da Madrugada (onde iniciei a minha carreira de frevista), com uma formação gigante: cinco violões de sete cordas; três bandolins; três cavaquinhos; três banjos; duas flautas; um flautim; dois clarinetes; dois saxofones altos; dois saxofones tenor; duas caixas; dois surdos; dois pandeiros e um coral com doze vozes.
Todo esse aparato instrumental foi arregimentado para fazer volume sonoro nas ruas do Recife antigo, sem a utilização de amplificadores. Além da música existe também toda uma indumentária criada para o carnaval, por um figurinista, com músicos bem produzidos.
— E o povo acompanha de perto, cantando, chorando, se emocionando com a agremiação— diz com alegria.{mospagebreak}
Refém dos projetos
O músico brasileiro de hoje é refém dos projetos semicoloniais para a área, como diz Marco, e tem que estar submetido às políticas culturais do município, do estado e do governo federal, do jeito que seus patrões querem, e que se fazem passar como coisa brasileira. Aliás, como se houvesse uma única cultura na sociedade brasileira:
— As leis de incentivo à cultura chegaram para atrapalhar o músico, na maioria das vezes. O artista tem que estar atento a tudo. Pessoas que não fazem música, empresários ou produtores culturais, estão com o poder na mão para gerenciar um trabalho, que muitas vezes não resulta em retorno financeiro para o músico. No final, as coisas se passam como se o artista até estivesse recebendo um favor.
Acrescenta:
— Projeto que, ao nosso ver, é muito representativo da nossa cultura, muitas vezes, chega na comissão de seleção e passa a ser descartado, por pura manipulação nos resultados. O músico hoje é o seu divulgador maior, e produzindo de forma independente se depara com a dificuldade de distribuição do seu produto. Muitos músicos estão se submetendo a tocar de graça para divulgar o seu trabalho e, outros, tendo que se utilizar de determinados ambientes para sobreviver. A orientação que eu transmito ao jovem é a de sempre cursar o nível superior, para que tenha um emprego na área da música onde ele possa garantir um sustento mínimo e tenha fôlego para produzir o que deseja. Por exemplo, o músico da noite sofre bastante com a falta de espaço nas casas de espetáculo, todavia, estão surgindo projetos musicais voltados para a música instrumental como: festivais de choro, músicas para teatro e dança.
Marco acredita que o desaparecimento parcial das casas de espetáculos se dá em razão da política econômica do governo, que gera a falta de dinheiro no bolso do povo, e pela falta de segurança nas ruas que faz com que ele se afaste desses locais, entre outras coisas: — A admissão de um músico numa casa pode gerar obrigações trabalhistas, o que deixa muitos donos de bares com dificuldades, porque sem a presença do cliente na mesa, não existirá caixa suficiente para manter os grupos.
E continua:
— Os músicos de vanguarda estão encontrando as saídas para escoar as suas produções nos festivais de música no exterior. Muitos músicos estão fazendo sucesso lá fora sem que o Brasil reconheça, criando suas produções independentes e apresentando propostas para o mundo da internet. A nossa música é muito respeitada no exterior e há um interesse muito grande pela música popular dançante.
Marco diz que a situação das orquestras e dos conjuntos regionais, como as bandas de pífanos, as marujadas e o bumba-meu-boi, é péssima, chegando a observar que, até certo ponto, estão desaparecendo, principalmente por falta de patrocínio. Mas acredita que essas manifestações culturais nunca irão acabar totalmente, independente de existir dinheiro ou não, porque fazem parte da vida do povo.
— Vão passando de pai para filho, e mantendo vivas as tradições — defende.
Sindicato não funciona
Marco César diz que em meio a muita falta de emprego e uma desqualificação do músico pelo mercado — que prefere investir no trabalho descartável, de baixa qualidade, não dando valor ao trabalho sério e à música cultural brasileira —, o sindicato dos músicos não trabalha.
— Pelo menos aqui em Recife, o sindicato não funciona. Paga-se uma taxa só para dizer que é sindicalizado, e mais nada. A Ordem dos Músicos do Brasil encontra-se sob intervenção — declara.
E acrescenta:
— Aqui os cachês são extraordinariamente injustos. Basta citar um evento da prefeitura petista do Recife, em que se pagou o valor de R$480 mil à dupla Sandy e Junior, incluindo avião fretado e tudo mais, enquanto que uma orquestra de frevo necessita apenas de cinco mil reais para fazer o mesmo evento e a prefeitura alega que não tem. A justificativa é: o povo pobre não tem dinheiro para assistir Sandy e Junior no teatro e esse evento traz turista para a cidade. Marco afirma que o sindicato não atua no caso dos cachês diferenciados. Segundo ele, o músico de fora tem um mega-cachê, o músico do estado, que mora fora, tem um razoável- cachê e o músico que contribui à cultura da cidade tem um irrisório-cachê. A passagem de som, a mesa de som, o tempo de apresentação, o horário, o camarim, o tratamento, enfim, tudo é completamente diferente em qualidade.
A escola ideal
Para Marco César, uma das maneiras de vencer as muitas barreiras impostas pelo monopólio das comunicações e o mercado fonográfico, os bloqueios por parte do Ministério da Cultura, os sindicatos que não funcionam, e tudo mais, seria a inserção da música cultural brasileira nas escolas públicas, porém aquela que tem laço cultural, que é representativa da cultura de um país, de um povo.
— É muito difícil lutar contra uma mídia que massacra os ouvidos do povo. O que falta é uma política de inserção nas escolas, de ensino fundamental e médio, da disciplina Educação Artística Musical, valorizando o melhor da cultura brasileira. O povo brasileiro gosta da sua música, mas esses meios de comunicação estão aí para impor e corromper o gosto e a sensibilidade. Por isso, precisamos voltar o melhor da nossa cultura e discernimento para o povo — defende.
Para Marco, o que vem acontecendo neste sentido, já que o governo não toma nenhuma iniciativa quanto à inclusão do ensino da música nos currículos das escolas públicas, de nível fundamental e médio, é o surgimento de escolas de choro em Brasília, Rio de Janeiro, Recife e São Paulo.
— É muito importante para a nova geração poder usufruir, nesses cursos, dos conhecimentos de grandes músicos brasileiros. Muitos não tiveram a oportunidade nem de ouvir choro, quanto mais tocar. Toda essa reviravolta acontece justamente por causa do excelente trabalho por parte de músicos da grandeza de: Reco do Bandolim, presidente do Clube do Choro de Brasília e da Escola Raphael Rabello; Maurício e Álvaro Carrilho, Luciana Rabello, Pedro Amorim — da Escola Portátil de Choro, no Rio de Janeiro —, acrescenta.
Dentro do Conservatório Pernambucano de Música, uma instituição pública tradicional, que ensina música no Recife, e também em sala de aula particular, Marco, juntamente com muitos músicos profissionais e alunos em estágio avançado, faz um trabalho de ensino da música cultural brasileira, como o choro, o samba e ritmos nordestinos, para pessoas de todas as idades, incluindo muitos jovens.
— Minha escola é uma sala particular de ensino de instrumentos e disciplinas teóricas da música, onde tenho a proposta de fazer a escola dos sonhos dos professores ser, ao mesmo tempo, a escola ideal para os alunos — conta com entusiasmo.
Para Marco, a escola dos sonhos dos professores, que ele vem buscando desenvolver, possui infra-estrutura, material didático e espaços diferenciados, com uma filosofia de trabalho voltada para a formação profissional do músico de cordas dedilhadas; análise do perfil sociológico do aluno, intervenção junto às famílias para o incentivo e orientação sobre a profissão do músico, esclarecendo sobre as questões financeiras, de performance, de busca da consciência musical, como forma de modificar a filosofia de vida, de busca da perfeição e reputação da profissão do músico no país.
É uma escola onde o músico recebe material didático, com partituras, arranjos e biografias específicas da área de metodologia de ensino. O método é criado pelo próprio aluno, com a adoção do estudo dirigido e do processo de dedução. Marco procura despertar o interesse do aluno pela pesquisa e demonstrar a diversidade de gêneros musicais possíveis de serem executados no seu instrumento. Além disso, demonstra formas de conquistar um espaço no mercado de trabalho, conscientizando o aluno de que ele, provavelmente, será o seu próprio divulgador.
Explica Marco:
— E a escola ideal para os alunos, no meu entender, tem como ponto de partida a concepção estética do aluno. A escola tem a obrigação de entrevistá-lo sobre suas pretensões musicais: se quer fazer música ou brincar de fazer música. Neste caso, o professor apresenta um direcionamento através de um organograma de tarefas. O incentivo e a motivação vêm de dentro para fora do indivíduo. Obter a confiança e a amizade da família são metas traçadas para um acompanhamento didático-pedagógico e devem obedecer os critério de uma busca da perfeição, sem fazê-lo presunçoso, acreditando que atingiu o seu limite máximo de esforço. Busca-se o aprimoramento e o refinamento da técnica, da percepção, da escrita, da organização, da conduta ética-profissional e social.
E aprofunda:
— A observância dos detalhes o faz se destacar dos outros, mas, sem esquecer de exercitar a filosofia do trabalho em sociedade leal e de ajuda mútua. A preocupação quanto a que momento terminará o curso e onde vai tocar deve ser eliminada com a orientação inicial baseada no princípio da dedução e estudo cumulativo, conscientizando-o sobre a necessidade do auto-aperfeiçoamento.
Prossegue o professor:
— O incentivo familiar é muito importante. Mas também, fazê-lo acreditar que é importante para a família, para o professor, para o grupo, para a escola, para a música e, principalmente, para ele mesmo. Apresentar as principais virtudes que ele tem, mas que devem ser trabalhadas; estimular o aluno a vencer as etapas mais difíceis e importantes; conscientizá-lo no sentido de que faz música porque gosta e não porque os pais gostam; aproximá-lo o máximo da escola e da profissão e trazê-lo para tocar profissionalmente com o professor também são coisas que fazem parte da escola ideal — fala o mestre.
O tempo de Marco César é dividido em muitas horas de trabalho em favor da música brasileira: ou está gravando um novo CD, ou dando aulas, ou fazendo algum arranjo para um artista, enfim, está trabalhando para que a música cultural popular não morra.
— No momento, vou ficar uma temporada em São Paulo, onde gravarei um CD com o valoroso artista pernambucano e grande amigo Antônio Nóbrega. Mas logo devo estar de volta a Recife e a minha escola — finaliza Marco César.
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sábado, 29 de outubro de 2011
segunda-feira, 24 de outubro de 2011
Johann Georg Grimm 1846-1887 (Do Blog: Turismo Vale do Café)
Nascido na Alemanha em 1846, Johann Georg Grimm, foi pastor de cabras, carpinteiro como o pai e também pintor de casas. Na década de 1860 transferiu-se para Munique, matriculando-se na Academia de Belas Artes. Em 1878 embarcou para o Rio de Janeiro, onde manteve contato com o comerciante e decorador Friedrich Anton Steckel. Neste período, viajou pelo interior do estado do Rio de Janeiro e Minas Gerais, pintando paisagens que reproduziam as fazendas de café e propriedades do campo dessas regiões.
http://www.johanngeorggrimm.org/
Postado por Nikson Salem
Dilma diz que o Pronatec reformará a educação profissional no Brasil Segundo a presidente, mais de 8 milhões serão beneficiados.
Capacitação de jovens e trabalhadores terá R$ 24 bilhões até 2014.
A presidente Dilma Rousseff disse nesta segunda-feira (24), durante seu programa de rádio “Café com a presidenta”, que o Pronatec, que será sancionado nos próximos dias, será a maior reforma da educação profissional já feita no Brasil.
O programa deverá qualificar, segundo a presidente, mais de 8 milhões de trabalhadores e estudantes.
No início do programa, Dilma explicou como irá funcionar o benefício. “O Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e ao Emprego, o Pronatec, é a maior reforma da educação profissional já feita no Brasil. Serão R$ 24 bilhões em investimentos para oferecer, até 2014, 8 milhões de vagas em curso de formação técnica e profissional, para os estudantes do ensino médio e para os trabalhadores. Vão ser 5,6 milhões de vagas para cursos de curta duração, destinados à qualificação profissional de trabalhadores. E mais 2,4 milhões de vagas para cursos técnicos, voltados para os estudantes do ensino médio, com duração de pelo menos um ano”.
Dilma falou ainda sobre os investimentos em núcleos profissionalizantes. “Estamos construindo 208 novas unidades dos Institutos Federais de Educação Profissional, sendo que 35 ficarão prontas este ano. Estamos fazendo parceria com o sistema S – Senai e Senac – que só este ano irá ampliar a oferta de cursos profissionalizantes gratuitos para 630 mil vagas. Além disso, investimos R$ 1,7 bilhão na construção de 176 escolas técnicas estaduais, e também na reforma, ampliação e compra de equipamentos de outras 543 unidades”.
Segundo a presidente, “o Pronatec também vai financiar cursos técnicos em escolas privadas de educação profissional”. “Além disso, os investimentos das empresas em educação profissional não serão mais tributados”, afirmou.
Dilma explicou também que o Pronatec vai oferecer oportunidades para os beneficiários do Programa Brasil sem Miséria. “O governo federal reservou 1,1 milhão de vagas para os beneficiários do Brasil sem Miséria. Vamos atuar em parceria com as prefeituras. Neste ano, teremos, para os beneficiários do Brasil sem Miséria, 55 mil vagas nos cursos do Senai, do Senac e nos institutos federais”.
A presidente Dilma Rousseff disse nesta segunda-feira (24), durante seu programa de rádio “Café com a presidenta”, que o Pronatec, que será sancionado nos próximos dias, será a maior reforma da educação profissional já feita no Brasil.
O programa deverá qualificar, segundo a presidente, mais de 8 milhões de trabalhadores e estudantes.
No início do programa, Dilma explicou como irá funcionar o benefício. “O Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e ao Emprego, o Pronatec, é a maior reforma da educação profissional já feita no Brasil. Serão R$ 24 bilhões em investimentos para oferecer, até 2014, 8 milhões de vagas em curso de formação técnica e profissional, para os estudantes do ensino médio e para os trabalhadores. Vão ser 5,6 milhões de vagas para cursos de curta duração, destinados à qualificação profissional de trabalhadores. E mais 2,4 milhões de vagas para cursos técnicos, voltados para os estudantes do ensino médio, com duração de pelo menos um ano”.
Dilma falou ainda sobre os investimentos em núcleos profissionalizantes. “Estamos construindo 208 novas unidades dos Institutos Federais de Educação Profissional, sendo que 35 ficarão prontas este ano. Estamos fazendo parceria com o sistema S – Senai e Senac – que só este ano irá ampliar a oferta de cursos profissionalizantes gratuitos para 630 mil vagas. Além disso, investimos R$ 1,7 bilhão na construção de 176 escolas técnicas estaduais, e também na reforma, ampliação e compra de equipamentos de outras 543 unidades”.
Segundo a presidente, “o Pronatec também vai financiar cursos técnicos em escolas privadas de educação profissional”. “Além disso, os investimentos das empresas em educação profissional não serão mais tributados”, afirmou.
Dilma explicou também que o Pronatec vai oferecer oportunidades para os beneficiários do Programa Brasil sem Miséria. “O governo federal reservou 1,1 milhão de vagas para os beneficiários do Brasil sem Miséria. Vamos atuar em parceria com as prefeituras. Neste ano, teremos, para os beneficiários do Brasil sem Miséria, 55 mil vagas nos cursos do Senai, do Senac e nos institutos federais”.
domingo, 16 de outubro de 2011
LITANIA DAS MOÇAS
Litania das moças
Nívea Moraes Marques
Roguem pelo céu
Que habita cedo no moço
De meu coração.
Manda meu Sinhô
Um anjo bem mandado
Para guardar os sorrisos
Desse moço
Por quem eu bordo
Fronhas
Desde que nasci
Por quem eu aprendi
A dançar
E a conversar
Em línguas estrangeiras
Só porque assim poderia ser mais perfeita
Ao seu lado
Por quem hás de inventar
E nascer outras vidas
Do meu frágil
Corpo de porcelana
Esse moço
Me faz colocar bobes no cabelo
Me faz pintar as unhas
E rezar novenas
Ave-maria se o encontrasse hoje
E o encorajasse a ser novelo
Cada fio um sentido e uma beleza
Nova para as minhas tarefas
Cotidianamente pousaria minha cabeça
No seu colo
E o convidaria a dar passeios
Longos
Pelo meu sonho
E se as horas fossem poucas
Deixaria que o peso de seus olhos
Fechassem os meus por uns segundos
E dormindo as tardes de domingo
Acordássemos de novo
Para nadar no fundo do dilúvio
Carregada de azuis da aliança;
Deus de novo conversaria
Com a criatura
E prenderia o céu
Nas nossas alianças
Pois é no peito da moça
Que nasce a família
Primeiro é assim
(nos seus bordados)
E depois é que chega o moço
E empresta o tino
Para que do delírio e da bela fazenda
Em que se borda
Faça-se o sol para ser
Faça-se o tempo de ser
Faça-se a chuva que molha
Não o chão, mas o solo do Pai
(que a cada dia espera mais um encontro
Mais este encontro
Pra ter fé, para exercer a fé
na sua própria
Criação.)
sábado, 15 de outubro de 2011
Belas Artes
Coordenador: Vinícius Queiroz Gomes
Telefone: 2682-1042 (ramal 214)
A Licenciatura em Belas Artes é recente na UFRRJ: nasceu em 2009. A criação deste curso na
Universidade tem duas origens: a inclusão de uma graduação artística na UFRRJ e a necessidade
de oferecer mais uma opção para os que desejassem seguir carreira nesta área – como pesquisadores,
professores e artistas em geral – já que no estado do Rio de Janeiro ele só existia na UFRJ.
No primeiro semestre letivo da nova graduação, o corpo docente era formado por apenas três
professores. Em 2010, o número subiu para 12 docentes efetivados.
– O número de professores vem aumentando. Sabemos que ainda há um longo caminho
para a consolidação total do curso na Universidade, mas ele já apresenta crescimento e
desenvolvimento notáveis – observa Fábio Macedo, atual coordenador do curso .
Segundo Vinicius Gomes, vice-coordenador de Belas Artes, que ocupou a coordenação interina
do curso no período de janeiro a abril de 2010, há projetos da Universidade que contam com a
participação desta graduação, como o Prodecência e o AnimaRural. Este último é uma iniciativa
própria do curso, no qual são realizadas exibições e debates sobre animações abertas ao público,
fato que vem atraindo o interesse e a participação de alunos de outras áreas.
Para o professor, o curso de Licenciatura em Belas Artes tem como horizonte humano contribuir
com um enriquecimento cultural da população.
– Além disso, o ensino de arte, mais do que atender a uma demanda funcional pública, busca em
um nível mais profundo, acolher uma demanda própria da alma humana: a ausência de arte na sociedade
nos aproxima da barbárie, mesmo dispondo de sofisticação lógica, tecnológica e científica e sabendo que
estas áreas integram o processo de aprendizado em arte. Gostaríamos que o compromisso com esse dado
fundamental fosse nosso cartão de visitas dentro e fora da Universidade – salienta.
Gomes ressalta que, como é característico em cursos novos, ainda é preciso uma adaptação
estrutural da Universidade ao curso, principalmente no quesito espaço para os equipamentos e para a
prática dos alunos durante as aulas:
– Nossa coordenação tem feito os esforços formais necessários. E nós, professores, temos certeza
de que a administração superior está sensível a essas demandas. Sabemos que brevemente poderemos
contar com equipamento, laboratórios e pessoal necessários a um excelente rendimento do curso e,
conseqüentemente, teremos uma boa avaliação por parte do MEC no momento correto.
De acordo com Gomes, o curso atende a uma grande demanda de professores de arte nas escolas.
– A inexistência de profissionais habilitados (nesse momento existe um sem-número de professores
atuando nos ensinos Médio e Fundamental sem formação específica) nos faz acreditar que estamos
no caminho certo – afirma.
O curso dura quatro anos e o profissional pode atuar com ensino, mas também com restauração,
escultura, pintura, desenho, organização de mostras e exposições, entre outras atividades ligadas à arte.
Telefone: 2682-1042 (ramal 214)
A Licenciatura em Belas Artes é recente na UFRRJ: nasceu em 2009. A criação deste curso na
Universidade tem duas origens: a inclusão de uma graduação artística na UFRRJ e a necessidade
de oferecer mais uma opção para os que desejassem seguir carreira nesta área – como pesquisadores,
professores e artistas em geral – já que no estado do Rio de Janeiro ele só existia na UFRJ.
No primeiro semestre letivo da nova graduação, o corpo docente era formado por apenas três
professores. Em 2010, o número subiu para 12 docentes efetivados.
– O número de professores vem aumentando. Sabemos que ainda há um longo caminho
para a consolidação total do curso na Universidade, mas ele já apresenta crescimento e
desenvolvimento notáveis – observa Fábio Macedo, atual coordenador do curso .
Segundo Vinicius Gomes, vice-coordenador de Belas Artes, que ocupou a coordenação interina
do curso no período de janeiro a abril de 2010, há projetos da Universidade que contam com a
participação desta graduação, como o Prodecência e o AnimaRural. Este último é uma iniciativa
própria do curso, no qual são realizadas exibições e debates sobre animações abertas ao público,
fato que vem atraindo o interesse e a participação de alunos de outras áreas.
Para o professor, o curso de Licenciatura em Belas Artes tem como horizonte humano contribuir
com um enriquecimento cultural da população.
– Além disso, o ensino de arte, mais do que atender a uma demanda funcional pública, busca em
um nível mais profundo, acolher uma demanda própria da alma humana: a ausência de arte na sociedade
nos aproxima da barbárie, mesmo dispondo de sofisticação lógica, tecnológica e científica e sabendo que
estas áreas integram o processo de aprendizado em arte. Gostaríamos que o compromisso com esse dado
fundamental fosse nosso cartão de visitas dentro e fora da Universidade – salienta.
Gomes ressalta que, como é característico em cursos novos, ainda é preciso uma adaptação
estrutural da Universidade ao curso, principalmente no quesito espaço para os equipamentos e para a
prática dos alunos durante as aulas:
– Nossa coordenação tem feito os esforços formais necessários. E nós, professores, temos certeza
de que a administração superior está sensível a essas demandas. Sabemos que brevemente poderemos
contar com equipamento, laboratórios e pessoal necessários a um excelente rendimento do curso e,
conseqüentemente, teremos uma boa avaliação por parte do MEC no momento correto.
De acordo com Gomes, o curso atende a uma grande demanda de professores de arte nas escolas.
– A inexistência de profissionais habilitados (nesse momento existe um sem-número de professores
atuando nos ensinos Médio e Fundamental sem formação específica) nos faz acreditar que estamos
no caminho certo – afirma.
O curso dura quatro anos e o profissional pode atuar com ensino, mas também com restauração,
escultura, pintura, desenho, organização de mostras e exposições, entre outras atividades ligadas à arte.
UNE entra na briga pelos 10% do Plano Nacional de Educação
Lucas Conejero
Com objetivo de evitar o sucateamento do sistema de ensino público e garantir uma educação gratuita e de qualidade para o povo, o movimento estudantil brasileiro colocou-se em marcha nos últimos meses. A pauta é extensa, mas resume-se em poucas palavras: 10% do PIB para a educação.
A inquietação começou durante os debates sobre o projeto de lei do Plano Nacional de Educação (PNE) enviado pelo governo federal ao Congresso Nacional no fim de 2010. A proposta, que indica aumento gradativo de 5% para 7% do PIB no sistema de educação até 2020, foi considerada insuficiente pelas principais organizações do país (ANEL e UNE) e os estudantes foram à praça protestar.
Leia também:
Está difícil ser jovem nos EUA
O espírito contraditório de Steve Jobs
O Rio de Janeiro está pacificado?
No último dia 31 de agosto, cerca de 12 mil militantes ligados à UNE marcharam pelos 10% em Brasília. Pouco dias depois, a ANEL lançou um manifesto, um abaixo-assinado e nas últimas semanas, organizou duas intervenções: uma na visita do ministro Fernando Haddad à USP, outra na homenagem ao ex-presidente Lula na UFBA. Recentemente, a UNE também lançou um abaixo-assinado pela causa e mais que isso, pede apoio da população para vincular 50% do fundo social do pré-sal na educação.
Os números e a triste realidade nas escolas e universidades públicas explicam a grita. Por exemplo, segundo dados da última Pnad (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios – 2009) do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), cerca de 14 milhões de brasileiros são analfabetos e 29,5 milhões são analfabetos funcionais, todos trabalhadores humildes, do campo e da cidade. Ou seja, aproximadamente um quarto da população mal sabe ler e escrever.
Elaborado em 1997 pela Comissão Organizadora do II Congresso Nacional de Educação e aprovado em plenária final, o primeiro Plano Nacional de Educação – Proposta da Sociedade Brasileira definiu metas, diretrizes, prioridades e estratégias de curto, médio e longo prazo. No auge da implantação do neoliberalismo no Brasil, a intenção era resistir, indicar um caminho viável, universalizar o direito à educação e fazer valer o artigo 6º da Constituição de 1988.
Para isso, a comissão indicou a necessidade de investimentos sem precedentes na educação e a conta fechou em 10% do PIB. À época, o Congresso aprovou 7%, percentual vetado pelo governo FHC. O veto seguiu intacto durante o governo Lula e atualmente cerca de 5% do PIB financiam a educação pública nacional.
“Não podemos aceitar o argumento de que não há recursos. O pagamento da dívida pública, as isenções fiscais para o setor empresarial, o recurso público usado para a copa e as olimpíadas, o dinheiro público que se perde na corrupção. Há verba, é preciso rever as prioridades e garantir o investimento na implementação dos direitos sociais universais”, argumenta o manifesto da ANEL, entidade controlada por estudantes independentes e partidos de esquerda.
Na última semana, o deputado Angelo Vanhoni (PT-PR), relator do PNE 2011-2020, afirmou que vai apresentar seu parecer em 15 dias e disse defender investimentos entre 7% e 10 % no texto. Direito constitucional e pilar fundamental de qualquer sociedade democrática, a educação representa a única saída para um futuro com progresso e justiça social.
Portanto, o momento é de comprometimento e participação da sociedade civil e da grande imprensa nas mobilizações, mas aqui no Brasil, infelizmente, isso é tão utópico quanto a democratização do ensino de primeiro grau e o fim da corrupção. Seja como for, os movimentos sociais brasileiros seguem escrevendo páginas de resistência na história do país e tenho certeza, vêem com bons olhos o retorno da UNE às trincheiras.
Com objetivo de evitar o sucateamento do sistema de ensino público e garantir uma educação gratuita e de qualidade para o povo, o movimento estudantil brasileiro colocou-se em marcha nos últimos meses. A pauta é extensa, mas resume-se em poucas palavras: 10% do PIB para a educação.
A inquietação começou durante os debates sobre o projeto de lei do Plano Nacional de Educação (PNE) enviado pelo governo federal ao Congresso Nacional no fim de 2010. A proposta, que indica aumento gradativo de 5% para 7% do PIB no sistema de educação até 2020, foi considerada insuficiente pelas principais organizações do país (ANEL e UNE) e os estudantes foram à praça protestar.
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No último dia 31 de agosto, cerca de 12 mil militantes ligados à UNE marcharam pelos 10% em Brasília. Pouco dias depois, a ANEL lançou um manifesto, um abaixo-assinado e nas últimas semanas, organizou duas intervenções: uma na visita do ministro Fernando Haddad à USP, outra na homenagem ao ex-presidente Lula na UFBA. Recentemente, a UNE também lançou um abaixo-assinado pela causa e mais que isso, pede apoio da população para vincular 50% do fundo social do pré-sal na educação.
Os números e a triste realidade nas escolas e universidades públicas explicam a grita. Por exemplo, segundo dados da última Pnad (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios – 2009) do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), cerca de 14 milhões de brasileiros são analfabetos e 29,5 milhões são analfabetos funcionais, todos trabalhadores humildes, do campo e da cidade. Ou seja, aproximadamente um quarto da população mal sabe ler e escrever.
Elaborado em 1997 pela Comissão Organizadora do II Congresso Nacional de Educação e aprovado em plenária final, o primeiro Plano Nacional de Educação – Proposta da Sociedade Brasileira definiu metas, diretrizes, prioridades e estratégias de curto, médio e longo prazo. No auge da implantação do neoliberalismo no Brasil, a intenção era resistir, indicar um caminho viável, universalizar o direito à educação e fazer valer o artigo 6º da Constituição de 1988.
Para isso, a comissão indicou a necessidade de investimentos sem precedentes na educação e a conta fechou em 10% do PIB. À época, o Congresso aprovou 7%, percentual vetado pelo governo FHC. O veto seguiu intacto durante o governo Lula e atualmente cerca de 5% do PIB financiam a educação pública nacional.
“Não podemos aceitar o argumento de que não há recursos. O pagamento da dívida pública, as isenções fiscais para o setor empresarial, o recurso público usado para a copa e as olimpíadas, o dinheiro público que se perde na corrupção. Há verba, é preciso rever as prioridades e garantir o investimento na implementação dos direitos sociais universais”, argumenta o manifesto da ANEL, entidade controlada por estudantes independentes e partidos de esquerda.
Na última semana, o deputado Angelo Vanhoni (PT-PR), relator do PNE 2011-2020, afirmou que vai apresentar seu parecer em 15 dias e disse defender investimentos entre 7% e 10 % no texto. Direito constitucional e pilar fundamental de qualquer sociedade democrática, a educação representa a única saída para um futuro com progresso e justiça social.
Portanto, o momento é de comprometimento e participação da sociedade civil e da grande imprensa nas mobilizações, mas aqui no Brasil, infelizmente, isso é tão utópico quanto a democratização do ensino de primeiro grau e o fim da corrupção. Seja como for, os movimentos sociais brasileiros seguem escrevendo páginas de resistência na história do país e tenho certeza, vêem com bons olhos o retorno da UNE às trincheiras.
O aloprado venceu o professor
Matheus Pichonelli
Rafinha dormiu justiceiro e acordou estuprador. Um dos papeis havia sido tirado dele. Sobrou o outro, e foi nele em que se agarrou. Foto: Renato Stokler
No começo do ano, pouco antes de pegar o ônibus para o trabalho, costumava tomar café numa loja de departamento – dessas que vendem de jornal a aparelho de celular. Para chegar ao segundo andar, onde funciona uma livraria, pegava a escada rolante e reparava, do alto, numa pequena aglomeração sobre um televisor. No dia seguinte, a aglomeração aumentava – era possível notar que alguns personagens voltavam acompanhados de algum amigo. Foi assim durante alguns dias: toda vez que pegava a escada rolante, notava que a pequena aglomeração havia se transformado numa pequena multidão.
Em volta da tevê, todos pareciam hipnotizados. E riam. Riam muito. Riam tão alto que fiquei curioso para saber o que tanto olhavam. Foi quando soube que o produto a venda não era a tevê, mas um DVD com as piadas feitas por Rafinha Bastos em seu show de stand up comedy.
Não sei quanto tempo o produto ficou a venda. Mas posso garantir que, enquanto deixou o DVD exposto, a megastore conseguiu reunir em semanas um público que fatalmente se acotovelaria para ver o comediante em sua casa de show. Comentei com um amigo, que tem amigos em comum com o Rafinha, e ele contou o seguinte: num dos programas semanais do qual participava na Bandeirantes, os futuros entrevistados sempre perguntavam à produção: “Mas é o Rafinha que vem?” Quando ele chegava para a pauta, geralmente para acompanhar o dia de um trabalhador ou apresentar matérias-denúncia sobre o descaso do poder público, as pessoas se preparavam, se aglomeravam (como na frente da tevê) e o tratavam como uma espécie de porta-voz da comunidade, capaz de amplificar em segundos uma queixa que, longe das câmeras, levaria anos para ser solucionada.
Leia também:
O humor do coronel
Ministra critica humor de Rafinha
Mas Rafinha Bastos é um personagem. Quando entrevistava (fosse ou não orientado pela produção), fazia crescer os olhos e a voz, numa tentativa, ora forçada, de mostrar indignação. Foi assim quando mostrou a suspeita de trabalho escravo envolvendo uma grife multinacional. Ou quando pedia providências para transporte público escolar. Ou quando dava as caras em reportagens sobre moradores de rua ou comerciantes ambulantes.
Ou quando passou dias comendo a merenda de uma escola pública diante das câmeras, em casa, numa tentativa de denunciar a falta de cuidado com os alimentos dos pobres estudantes.
Sem internet, Rafinha seria como o professor que ganha os alunos com piadas e frases-feitas. Mas havia milhões na plateia, e uma trincheira na vida real. Foto: Divulgação
Rafinha Bastos era um fenômeno, embora jogasse um jogo aparentemente fácil: de um lado, crianças (ou injustiçados); de outro, um político de antemão apresentado como insensível.
Mas um fenômeno, no Brasil, precisa se resguardar em cuidados para não deixar a mostra os outros lados da mesma personalidade. Jogadores, cantores, políticos, empresários e até jornalistas gastam o que têm e o que não têm em cursos de etiqueta e manuais de mídia training: posam abraçando crianças e proferindo frases-feitas para aplausos na plateia do Faustão. Quase nunca deixam brechas: o ralho com a empregada, a piada sobre a mulher feia, a agressão aos filhos e o suborno na Receita quase nunca saem no jornal. Se sair, é pena de morte.
Foi aí que Rafinha tomou o contragolpe. Não por sua postura na vida pessoal (que poucos sabem), mas pela postura de seu outro personagem. Durante algum tempo, ele transitou entre o repórter socialmente responsável (ao menos para o público) e o piadista sem-noção, oriundo de uma escola cujo escracho vale mais que mil paródias. Se é rindo que se corrigem os costumes, o Rafinha piadista e sua trupe (sim, porque não estava sozinho) pareciam inverter ou desprezar a própria função: os pobres que continuassem pobres, os feios que seguissem feios, os ladrões que continuassem ladrões e os indignados que rissem de tudo, porque rir era o fim e não o meio.
De alguma forma, colocar puta, traficante, ator e viciado no mesmo balaio parecia engraçado. E, por um motivo aparentemente inexplicável, o mesmo ator que defendia os injustiçados dos políticos não parecia desmentir o comediante que chutava todo mundo, injustiçados inclusive.
Com o papel, ele passou a despertar antipatia nos jornalistas, que não o reconheciam como colega – e nem tinham as mesmas ferramentas para estourar miolos de mosquitos com metralhadora. Mas Rafinha não precisava dos colegas: enquanto tivesse aplauso, não precisaria da mídia nem de ninguém. Para chegar ao público, bastava falar. Tinha sua própria casa de shows e sua própria rede de seguidores, milhares de seguidores em redes sociais que o levaram a ser considerado como a personalidade mais influente do Twitter em matéria do New York Times.
Mas um dia alguém percebeu a contradição entre os dois papéis que, durante pelo menos três anos, o ator desempenhou. Havia uma trincheira em volta dele, e ele parece não ter notado: os zilhares de seguidores não o salvariam da trairagem da própria bancada do CQC. Faltava acender um isqueiro. Um dia, ele falou sobre a mulher do amigo do colega que era pago pela empresa que também bancava o sócio do marido do amigo do colega.
Bastaram quatro pessoas, uma empresa (talvez mais) e um bebê. E a velha mídia, que teme pelos seus anunciantes, acendeu a patrulha e deu o bote.
Rafinha dormiu justiceiro e acordou “estuprador”. Um dos papéis havia sido tirado dele. Sobrou o outro, e foi nele em que se agarrou, cuspindo em todos os que acreditava não precisar. Bastava, talvez, um pedido de desculpas, recorrendo, como todo mundo faz, à tal da humanidade que nos leva a cometer erros infantis, fora de contexto e tudo mais. Por algum outro motivo (também inexplicável) a resposta foi outra: receita de bolo para um, banana para outros, cacete para outros mais. Hoje, levar o “justiceiro” para mostrar as mazelas da comunidade ou mostrá-lo como anunciante pega mal. Parte da plateia evaporou.
Poucos entendem – e qualquer tentativa de explicação fatalmente cairá no moralismo, em julgamento ou fofoquinha. Muitos dirão: mas por que tanta tinta gasta com um artista se há tanta fome no mundo? Porque, mídia e espectadores, não conseguem entender a que se deve um fenômeno como Rafinha. Talvez nem ele mesmo. Por ser um fenômeno forjado na internet, embora alavancado na tevê, o assunto se torna inesgotável. Sem medo de errar, é possível dizer que hoje ninguém, nem político nem empresário nem qualquer outro artista, tenha a mesma capacidade de se tornar assunto, gerar polêmica e discussões no Brasil como o Rafinha Bastos.
Desafio quem quiser a sair na rua e encontrar mais de duas pessoas, entre 12 e 35 anos, num grupo de cem, que saibam citar duas palavras proferidas pela presidenta Dilma Rousseff na abertura da Assembleia Geral da Onu. E desafio o mesmo curioso a encontrar, nesse mesmo grupo, dois jovens que não saibam citar de cabeça ao menos uma polêmica protagonizada por Rafinha na última semana.
A polêmica alimentada na polêmica fez com que Rafinha (ou a suposta decadência dele) se tornasse tema obrigatório em qualquer site para alavancar a audiência.
'Por um motivo aparentemente inexplicável, o mesmo ator que defendia os injustiçados dos políticos não parecia desmentir o comediante que chutava todo mundo, injustiçados inclusive'
Parte do fascínio sobre o comediante tem origem na mesma pergunta: como? Como é possível?
Arrisco: Rafinha fala com a juventude, ou com adultos juvenis, que ainda são capazes de rolar de rir se alguém tropeça na frente deles em uma casca de banana. Lembra, em alguns aspectos, o professor que ganha os alunos no cursinho ou no colegial: se apresenta com piadas constrangedoras (sobre a loira, sobre a monga, sobre o lerdo, sobre o deficiente), mas dá a sua aula; fala frases-feitas, e ganha a admiração de todos; transita entre o sério e o sem-noção; tem o domínio de um público que ainda forma a opinião sobre qualquer coisa. E tem a vantagem de estar na frente de todos, o microfone às mãos. De novo, com outros recursos, parece um jogo fácil. Como jogar políticos contra um público com pena das crianças.
Mas um dia os alunos crescem. E as piadas (como a vida) deixam de parecer engraçadas. E as frases-feitas, a moral da história, já não fazem sentido. E o professor aloprado, ídolo da molecada, vira o babão em pouco tempo (mas o público se recicla, e no ano seguinte, novos alunos surgem). Vendo o Rafinha, lembro de todos os professores do colégio e cursinho que domavam as feras de 18 anos, mas que hoje não sobreviveriam a dez minutos de argumentos num reencontro de turma, dez anos depois.
A diferença é que, com os sites de compartilhamento, as redes sociais, e as páginas eletrônicas de fofoca, a sala de aula se transformou numa plateia para milhões. Com a trincheira à sua volta, cavada pelos amigos e empregadores, o tombo só foi maior. O mundo da celebridade é assim: ela se alimenta dos picos, mas também da decadência. E decreta prisão perpétua para quem errou no lance final.
Rafinha dormiu justiceiro e acordou estuprador. Um dos papeis havia sido tirado dele. Sobrou o outro, e foi nele em que se agarrou. Foto: Renato Stokler
No começo do ano, pouco antes de pegar o ônibus para o trabalho, costumava tomar café numa loja de departamento – dessas que vendem de jornal a aparelho de celular. Para chegar ao segundo andar, onde funciona uma livraria, pegava a escada rolante e reparava, do alto, numa pequena aglomeração sobre um televisor. No dia seguinte, a aglomeração aumentava – era possível notar que alguns personagens voltavam acompanhados de algum amigo. Foi assim durante alguns dias: toda vez que pegava a escada rolante, notava que a pequena aglomeração havia se transformado numa pequena multidão.
Em volta da tevê, todos pareciam hipnotizados. E riam. Riam muito. Riam tão alto que fiquei curioso para saber o que tanto olhavam. Foi quando soube que o produto a venda não era a tevê, mas um DVD com as piadas feitas por Rafinha Bastos em seu show de stand up comedy.
Não sei quanto tempo o produto ficou a venda. Mas posso garantir que, enquanto deixou o DVD exposto, a megastore conseguiu reunir em semanas um público que fatalmente se acotovelaria para ver o comediante em sua casa de show. Comentei com um amigo, que tem amigos em comum com o Rafinha, e ele contou o seguinte: num dos programas semanais do qual participava na Bandeirantes, os futuros entrevistados sempre perguntavam à produção: “Mas é o Rafinha que vem?” Quando ele chegava para a pauta, geralmente para acompanhar o dia de um trabalhador ou apresentar matérias-denúncia sobre o descaso do poder público, as pessoas se preparavam, se aglomeravam (como na frente da tevê) e o tratavam como uma espécie de porta-voz da comunidade, capaz de amplificar em segundos uma queixa que, longe das câmeras, levaria anos para ser solucionada.
Leia também:
O humor do coronel
Ministra critica humor de Rafinha
Mas Rafinha Bastos é um personagem. Quando entrevistava (fosse ou não orientado pela produção), fazia crescer os olhos e a voz, numa tentativa, ora forçada, de mostrar indignação. Foi assim quando mostrou a suspeita de trabalho escravo envolvendo uma grife multinacional. Ou quando pedia providências para transporte público escolar. Ou quando dava as caras em reportagens sobre moradores de rua ou comerciantes ambulantes.
Ou quando passou dias comendo a merenda de uma escola pública diante das câmeras, em casa, numa tentativa de denunciar a falta de cuidado com os alimentos dos pobres estudantes.
Sem internet, Rafinha seria como o professor que ganha os alunos com piadas e frases-feitas. Mas havia milhões na plateia, e uma trincheira na vida real. Foto: Divulgação
Rafinha Bastos era um fenômeno, embora jogasse um jogo aparentemente fácil: de um lado, crianças (ou injustiçados); de outro, um político de antemão apresentado como insensível.
Mas um fenômeno, no Brasil, precisa se resguardar em cuidados para não deixar a mostra os outros lados da mesma personalidade. Jogadores, cantores, políticos, empresários e até jornalistas gastam o que têm e o que não têm em cursos de etiqueta e manuais de mídia training: posam abraçando crianças e proferindo frases-feitas para aplausos na plateia do Faustão. Quase nunca deixam brechas: o ralho com a empregada, a piada sobre a mulher feia, a agressão aos filhos e o suborno na Receita quase nunca saem no jornal. Se sair, é pena de morte.
Foi aí que Rafinha tomou o contragolpe. Não por sua postura na vida pessoal (que poucos sabem), mas pela postura de seu outro personagem. Durante algum tempo, ele transitou entre o repórter socialmente responsável (ao menos para o público) e o piadista sem-noção, oriundo de uma escola cujo escracho vale mais que mil paródias. Se é rindo que se corrigem os costumes, o Rafinha piadista e sua trupe (sim, porque não estava sozinho) pareciam inverter ou desprezar a própria função: os pobres que continuassem pobres, os feios que seguissem feios, os ladrões que continuassem ladrões e os indignados que rissem de tudo, porque rir era o fim e não o meio.
De alguma forma, colocar puta, traficante, ator e viciado no mesmo balaio parecia engraçado. E, por um motivo aparentemente inexplicável, o mesmo ator que defendia os injustiçados dos políticos não parecia desmentir o comediante que chutava todo mundo, injustiçados inclusive.
Com o papel, ele passou a despertar antipatia nos jornalistas, que não o reconheciam como colega – e nem tinham as mesmas ferramentas para estourar miolos de mosquitos com metralhadora. Mas Rafinha não precisava dos colegas: enquanto tivesse aplauso, não precisaria da mídia nem de ninguém. Para chegar ao público, bastava falar. Tinha sua própria casa de shows e sua própria rede de seguidores, milhares de seguidores em redes sociais que o levaram a ser considerado como a personalidade mais influente do Twitter em matéria do New York Times.
Mas um dia alguém percebeu a contradição entre os dois papéis que, durante pelo menos três anos, o ator desempenhou. Havia uma trincheira em volta dele, e ele parece não ter notado: os zilhares de seguidores não o salvariam da trairagem da própria bancada do CQC. Faltava acender um isqueiro. Um dia, ele falou sobre a mulher do amigo do colega que era pago pela empresa que também bancava o sócio do marido do amigo do colega.
Bastaram quatro pessoas, uma empresa (talvez mais) e um bebê. E a velha mídia, que teme pelos seus anunciantes, acendeu a patrulha e deu o bote.
Rafinha dormiu justiceiro e acordou “estuprador”. Um dos papéis havia sido tirado dele. Sobrou o outro, e foi nele em que se agarrou, cuspindo em todos os que acreditava não precisar. Bastava, talvez, um pedido de desculpas, recorrendo, como todo mundo faz, à tal da humanidade que nos leva a cometer erros infantis, fora de contexto e tudo mais. Por algum outro motivo (também inexplicável) a resposta foi outra: receita de bolo para um, banana para outros, cacete para outros mais. Hoje, levar o “justiceiro” para mostrar as mazelas da comunidade ou mostrá-lo como anunciante pega mal. Parte da plateia evaporou.
Poucos entendem – e qualquer tentativa de explicação fatalmente cairá no moralismo, em julgamento ou fofoquinha. Muitos dirão: mas por que tanta tinta gasta com um artista se há tanta fome no mundo? Porque, mídia e espectadores, não conseguem entender a que se deve um fenômeno como Rafinha. Talvez nem ele mesmo. Por ser um fenômeno forjado na internet, embora alavancado na tevê, o assunto se torna inesgotável. Sem medo de errar, é possível dizer que hoje ninguém, nem político nem empresário nem qualquer outro artista, tenha a mesma capacidade de se tornar assunto, gerar polêmica e discussões no Brasil como o Rafinha Bastos.
Desafio quem quiser a sair na rua e encontrar mais de duas pessoas, entre 12 e 35 anos, num grupo de cem, que saibam citar duas palavras proferidas pela presidenta Dilma Rousseff na abertura da Assembleia Geral da Onu. E desafio o mesmo curioso a encontrar, nesse mesmo grupo, dois jovens que não saibam citar de cabeça ao menos uma polêmica protagonizada por Rafinha na última semana.
A polêmica alimentada na polêmica fez com que Rafinha (ou a suposta decadência dele) se tornasse tema obrigatório em qualquer site para alavancar a audiência.
'Por um motivo aparentemente inexplicável, o mesmo ator que defendia os injustiçados dos políticos não parecia desmentir o comediante que chutava todo mundo, injustiçados inclusive'
Parte do fascínio sobre o comediante tem origem na mesma pergunta: como? Como é possível?
Arrisco: Rafinha fala com a juventude, ou com adultos juvenis, que ainda são capazes de rolar de rir se alguém tropeça na frente deles em uma casca de banana. Lembra, em alguns aspectos, o professor que ganha os alunos no cursinho ou no colegial: se apresenta com piadas constrangedoras (sobre a loira, sobre a monga, sobre o lerdo, sobre o deficiente), mas dá a sua aula; fala frases-feitas, e ganha a admiração de todos; transita entre o sério e o sem-noção; tem o domínio de um público que ainda forma a opinião sobre qualquer coisa. E tem a vantagem de estar na frente de todos, o microfone às mãos. De novo, com outros recursos, parece um jogo fácil. Como jogar políticos contra um público com pena das crianças.
Mas um dia os alunos crescem. E as piadas (como a vida) deixam de parecer engraçadas. E as frases-feitas, a moral da história, já não fazem sentido. E o professor aloprado, ídolo da molecada, vira o babão em pouco tempo (mas o público se recicla, e no ano seguinte, novos alunos surgem). Vendo o Rafinha, lembro de todos os professores do colégio e cursinho que domavam as feras de 18 anos, mas que hoje não sobreviveriam a dez minutos de argumentos num reencontro de turma, dez anos depois.
A diferença é que, com os sites de compartilhamento, as redes sociais, e as páginas eletrônicas de fofoca, a sala de aula se transformou numa plateia para milhões. Com a trincheira à sua volta, cavada pelos amigos e empregadores, o tombo só foi maior. O mundo da celebridade é assim: ela se alimenta dos picos, mas também da decadência. E decreta prisão perpétua para quem errou no lance final.
Memória reavivada
Orlando Margarido 14 de outubro
Leitura, de Almeida Júnior
Nem rodin nem Olafur Eliasson. O que mantém a fidelidade de um visitante típico da Pinacoteca do Estado não são as esculturas do século XIX do francês responsável, em 1995, por um alentado recorde de bilheteria. Tampouco as instalações grandiosas e desafiadoras ao olhar do artista dinamarquês atualmente expostas no prédio da Luz, ou qualquer outra criação contemporânea. Carrega o sintomático título de Saudade a tela de Almeida Júnior que se mantém predileta e convoca protestos do público quando retirada, seja por curtos períodos, do posto cativo no segundo andar da instituição, aquele determinado ao acervo. Seus entusiastas não têm motivo de preocupação também agora, quando a pintura de 1899 foi movida apenas alguns metros para compor, com outras de mesma filiação acadêmica, a nova mostra da coleção do museu. Batizada Arte no Brasil – Uma história na Pinacoteca de São Paulo, trata-se da primeira renovação desde que o endereço passou há 13 anos pela reforma estrutural consagradora de seu papel influente no cenário cultural.
Sem receio, pode-se ampliar o gosto popular por Saudade a todas as telas do pintor paulista caipira e em certa medida a seus pares de Academia, como bem sabem os dirigentes e especialistas envolvidos com esse universo artístico. Há algo de acolhedor, de imediata apreensão nesses retratos, paisagens, naturezas-mortas, figuras femininas e masculinas em repouso, na pintura histórica e de gênero que tanto evoca memórias. Por isso mesmo, maior é a responsabilidade de um reduto privilegiado como a Pinacoteca em exibir tal arte. De um acervo de 9 mil peças, 8 mil enfeixam da produção colonial à moda moderna. São períodos contemplados na atual disposição por cerca de 500 obras, entre telas, esculturas, desenhos, gravuras e fotografias, muitas delas recém-restauradas em ateliê próprio. Devido à sua origem ligada à estrutura de mecenato e a uma escola de belas artes nas primeiras décadas do século XX, é natural encontrar na entidade uma concentração distintiva da fase que se consagrou chamar acadêmica, a predileta de uma burguesia do período. Daí lotes significativos de Almeida Júnior, que soma 48 pinturas, das quais podem ser apreciadas ainda O Importuno e Leitura, entre outras, além de Oscar Pereira da Silva, Eliseu Visconti e Pedro Alexandrino, por exemplo.
Manter este e demais nomes e seus trabalhos de fama e carinho para o público não foi decisão aleatória. Uma pesquisa determinou queixas dos visitantes a respeito da amplitude do espaço e da dificuldade em vencê-lo, na dúvida de ter cumprido todo o roteiro. Levado em conta também o excesso de obras, o dobro de hoje, a opção foi criar um percurso cronológico por 11 salas voltadas a temas, movimentos e condições específicas do fazer artístico. Para tanto, lembra a curadora, Valéria Piccoli, duas linhas de pensamento nortearam o projeto, uma sobre uma identidade nacional, exemplar no Modernismo, outra sobre a criação de um sistema de arte que relaciona as chamadas Missões Artísticas ou a própria Academia como escola de aprendizado.*
quarta-feira, 12 de outubro de 2011
Barra Mansa realiza procissão fluvial em homenagem a padroeira do Brasil
Evento deve reunir cerca de 20 mil pessoas
A 51ª edição da tradicional Procissão Fluvial e Terrestre em Louvor à Nossa Senhora Aparecida, Padroeira do Brasil, acontece nesta quarta-feira, dia 12, por várias ruas da cidade. O evento é organizado pela Igreja Matriz de São Sebastião, Associação de Canoeiros de Barra Mansa e a Família Baião, com o apoio da Prefeitura de Barra Mansa. Os organizadores estimam a participação de aproximadamente 20 mil pessoas durante todo o trajeto.
O prefeito Zé Renato comenta sobre a procissão que atrai fiéis de toda região. “Todos os anos, a população devota de Nossa Senhora Aparecida aguarda ansiosa o dia 12 de outubro para prestar uma homenagem. Fiéis de várias cidades da região vêm até o município participar da tradicional procissão em louvor à Mãe de Deus. Tenho certeza que as comemorações deste ano também serão emocionantes e vão arrastar uma multidão de fiéis pelas ruas da cidade”, falou o prefeito.
As comemorações pelo Dia da Padroeira terão início com uma carreata, que sairá da residência da Família Baião, na Rua Pinto Ribeiro, nº 292, no Centro. De lá, a carreata segue pelas ruas Duque de Caxias, Orozimbo Ribeiro e José Martorano, avenidas Joaquim Leite e Dário Aragão, depois para as ruas Orozimbo Ribeiro e João Chiesse Filho, avenidas Três de Outubro e Homero Leite e várias ruas do bairro Vila Maria. Ao mesmo tempo vai ser realizado, às 16 horas, um louvor com o Grupo Vida, na Avenida Presidente Vargas (atrás da atual Câmara Municipal).
Depois da procissão chegar no bairro Vila Maria, às 16h30min, haverá Celebração da Palavra na Igreja Nossa Senhora Aparecida, de onde o grupo dará início, às 17 horas, à procissão de barcos pelo Rio Paraíba do Sul, do bairro Vila Maria até o Centro da cidade. A chegada da procissão fluvial está prevista para às 19 horas, atrás da Câmara Municipal. De lá, os fiéis sairão em procissão pelas ruas Juiz Dr. Antônio Ciani, Benedita Helena de Lima, Travessia da Linha Férrea, Avenida Dário Aragão, ruas Orozimbo Ribeiro, José Martorano e Avenida Joaquim Leite até a Igreja Matriz de São Sebastião. Depois da bênção na Igreja, a procissão retorna para a casa da Família Baião, às 20h30min.
O trajeto contará com o apoio do Corpo de Bombeiros e da Guarda Municipal em botes, com uma equipe de salva-vidas. As autoridades pedem a cautela dos participantes, como explicou o comandante da Guarda Municipal, Carlos Natanael Geremias. “Muitas pessoas costumam participar do evento a nado ou utilizando boias, mas pedimos que tomem o máximo de cuidado, que usem coletes salva-vidas e que evitem entrar no Rio Paraíba se estiverem alcoolizadas”, alertou Natanael, ao informar que o nível do rio está baixo aumentando o risco no local. “O ideal é que as pessoas evitem de entrar no rio e deixem que os profissionais qualificados façam a parte do trajeto fluvial”, concluiu.
MINHAS PELES
“'Quem sou eu?' Às vezes me comparo com as cobras, não por serpentário ou venenoso, mas tão-só porque eu e elas mudamos de pele de vez em quando. Usei muitas peles nessa minha vida já longa, e é delas que vou falar.
A primeira de minhas peles que vale a pena ser recordada é a do filho da professora primária, Mestra Fininha, de uma cidadezinha do centro do Brasil.
Outra saudosa pele minha foi a de etnólogo indigenista. Vestido nela, vivi dez anos nas aldeias indígenas do Pantanal e da Amazônia.
Não os salvei e esta é a dor que mais me dói. Apenas consolam algumas poucas conquistas, como a criação do Parque Indígena do Xingu e do Museu do Índio, no Rio de Janeiro.
Pele que encarnei e encarno ainda, com orgulho, é a de educador, função que exerço há quatro décadas. Essa, de fato, foi minha ocupação principal desde que deixei etnologia de campo.
Eu investia contra o analfabetismo ou pela reforma da universidade com mais ímpeto de paixão que sabedoria pedagógica. Não me dei mal. Acabei ministro de educação de meu país e fundador e primeiro reitor da Universidade de Brasília.
Outra pele que ostentei e ostento ainda é a de político. Sempre fui, em toda a minha vida adulta, um cidadão ciente de mim mesmo como um ser dotado de direitos e investido de deveres. Sobretudo o dever de intervir nesse mundo para melhorá-lo.
Com a pele de político militante fui duas vezes ministro de Estado, mas me ocupei fundamentalmente foi na luta por reformas sociais, que ampliassem as bases da sociedade e da economia, a fim de criar uma prosperidade generalizável a toda a população.
Fracassando nessa luta pelas reformas, me vi exilado por muitos anos e vivi em diversos países. Minha pele de proscrito foi mais leve do que poderia supor.
Meu ofício naqueles anos foi de professor de antropologia e, principalmente, reformador de universidades. Disto vivi.
No exílio, devolvido a mim, me fiz romancista, cumprindo uma vocação precoce que me vem da juventude.
Só no meu exílio, nos seus longos vagares, tive ocasião e desejo de novamente romancear.
De volta do exílio, retomei minhas peles todas. Hoje estou no Brasil lutando pelas minhas velhas causas: salvação dos índios, educação popular, a universidade necessária, o desenvolvimento nacional a democracia, a liberdade. No plano político, fui eleito vice-governador do Rio de Janeiro e depois senador da República.
Essas são as peles que tenho para exibir. Em todas e em cada uma delas me exerci sempre igual a mim, mas também variando sempre.”
Texto de Darcy Ribeiro publicado em 1995 no livro de sua autoria O Brasil como Problema.
A primeira de minhas peles que vale a pena ser recordada é a do filho da professora primária, Mestra Fininha, de uma cidadezinha do centro do Brasil.
Outra saudosa pele minha foi a de etnólogo indigenista. Vestido nela, vivi dez anos nas aldeias indígenas do Pantanal e da Amazônia.
Não os salvei e esta é a dor que mais me dói. Apenas consolam algumas poucas conquistas, como a criação do Parque Indígena do Xingu e do Museu do Índio, no Rio de Janeiro.
Pele que encarnei e encarno ainda, com orgulho, é a de educador, função que exerço há quatro décadas. Essa, de fato, foi minha ocupação principal desde que deixei etnologia de campo.
Eu investia contra o analfabetismo ou pela reforma da universidade com mais ímpeto de paixão que sabedoria pedagógica. Não me dei mal. Acabei ministro de educação de meu país e fundador e primeiro reitor da Universidade de Brasília.
Outra pele que ostentei e ostento ainda é a de político. Sempre fui, em toda a minha vida adulta, um cidadão ciente de mim mesmo como um ser dotado de direitos e investido de deveres. Sobretudo o dever de intervir nesse mundo para melhorá-lo.
Com a pele de político militante fui duas vezes ministro de Estado, mas me ocupei fundamentalmente foi na luta por reformas sociais, que ampliassem as bases da sociedade e da economia, a fim de criar uma prosperidade generalizável a toda a população.
Fracassando nessa luta pelas reformas, me vi exilado por muitos anos e vivi em diversos países. Minha pele de proscrito foi mais leve do que poderia supor.
Meu ofício naqueles anos foi de professor de antropologia e, principalmente, reformador de universidades. Disto vivi.
No exílio, devolvido a mim, me fiz romancista, cumprindo uma vocação precoce que me vem da juventude.
Só no meu exílio, nos seus longos vagares, tive ocasião e desejo de novamente romancear.
De volta do exílio, retomei minhas peles todas. Hoje estou no Brasil lutando pelas minhas velhas causas: salvação dos índios, educação popular, a universidade necessária, o desenvolvimento nacional a democracia, a liberdade. No plano político, fui eleito vice-governador do Rio de Janeiro e depois senador da República.
Essas são as peles que tenho para exibir. Em todas e em cada uma delas me exerci sempre igual a mim, mas também variando sempre.”
Texto de Darcy Ribeiro publicado em 1995 no livro de sua autoria O Brasil como Problema.
Fernando Morais e o terrorismo dos EUA contra Cuba
Houve um tempo em que mercenários contratados por organizações de extrema-direita da Flórida recebiam U$ 1,5 mil por bomba colocada em Cuba. “Hoje ainda é possível ver em Miami manifestações de rua contra a Revolução, mas as novas gerações parecem mais interessadas em ouvir salsa do que em colocar bombas”, diz o jornalista Fernando Morais ao Vermelho.
Morais está lançando Os últimos soldados da Guerra Fria, livro-reportagem que reconstitui a trajetória de agentes secretos de Cuba, que se infiltraram nos Estados Unidos para impedir ações terroristas contra a ilha.
No próximo dia 20, às 19h, ele apresenta a publicação em São Paulo, na Faculdade Paulista de Comunicação (Fapcom). Na ocasião, o autor participa do debate “Os 5 cubanos ignorados pela mídia”, ao lado da presidente do Conselho Mundial da Paz (CMP), Socorro Gomes, e do cônsul de Cuba, Lázaro Mendes Cabrera. O evento é promovido pelo Centro de Estudos da Mídia Barão de Itararé.
A discussão acontece no momento em que René González – um dos agentes secretos retratados no livro – acaba de ser libertado, nos Estados Unidos, depois de 13 anos de prisão. Apesar de ter cumprido toda a sua pena, René está sendo obrigado pela Justiça norte-americana a permanecer nos EUA, em “liberdade vigiada”, por mais três anos.
Esse é apenas o capítulo mais recente da trama narrada por Morais, que poderia muito bem ter saído de um trailer hollywoodiano – com cenas de espionagem, suspense e aventura –, mas não tem nada de ficção. Foi vivida por 12 homens e duas mulheres que aceitaram deixar suas vidas em Cuba para integrar a Rede Vespa e espionar algumas das 47 organizações anticubanas que existiam em Miami na época.
“Eram organizações de extrema-direita, que atuavam como entidades humanitárias para ocultar seu verdadeiro objetivo”, conta Morais ao Vermelho. Tais grupos – contrários ao regime comunista implantado por Fidel Castro – se dedicavam desde a jogar pragas nas lavouras cubanas até a sequestrar aviões que levavam turistas à ilha.
Depois do colapso da União Soviética, o turismo assumiu papel preponderante na economia cubana, e as organizações anticastristas passaram a empenhar esforços para demonstrar que a ilha não era segura para os estrangeiros. Para isso, colocaram bombas em hotéis e bares e alvejaram navios repletos de visitantes. Infiltrados nesses grupos, os agentes da Rede Vespa conseguiram impedir várias agressões.
Para investigar e contar essa história – e também a daqueles que estavam do outro lado –, Morais viajou 20 vezes a Cuba e aos Estados Unidos, debruçou-se sobre diversos documentos dos dois países, fez 40 entrevistas.
O resultado é uma obra que já é sucesso de vendas no Brasil. De acordo com a Rádio Havana Cuba, o livro vendeu 20 mil exemplares em três semanas e aguarda lançamento em espanhol e inglês. Conhecedor da realidade cubana (este é o segundo livro relacionado à ilha que escreve), Morais fala ao Vermelho sobre a publicação, as relações entre Cuba e Estados Unidos e seus próximos projetos.
Segundo ele, se o presidente Barack Obama se reeleger, no ano que vem, pode ser que indulte os agentes cubanos que ainda estão presos nos Estados Unidos. “Enquanto Obama precisar dos votos da Flórida, majoritariamente cubanos, não há a menor chance de isso acontecer”, avalia. Veja abaixo a entrevista concedida por e-mail.
Portal Vermelho: Como e quando você se deparou com a história dos agentes secretos cubanos e por que resolveu escrevê-la?
Fernando Morais: Eu soube da história pelo rádio de um táxi, no meio do trânsito, em São Paulo, no dia das prisões dos dez agentes cubanos pelo FBI, em Miami, em setembro de 1998. Assim que pude, viajei a Cuba para tentar levantar o assunto, mas encontrei todas as portas fechadas. Para se ter uma ideia, Cuba só assumiu que eles de fato eram agentes de inteligência três anos depois, em 2001. O tema era tratado como segredo de Estado.
Portal Vermelho: Como foi pesquisar em Cuba? Você teve pleno acesso a documentos oficiais? E do lado norte-americano?
Fernando Morais: Os cubanos só liberaram o assunto para mim em 2005, mas nessa época eu estava envolvido com o projeto do livro O Mago, a biografia do Paulo Coelho. Com isso, só pude entrar na história dos cubanos em 2008. A partir de então fui várias vezes a Havana, Miami e Nova York. O governo de Cuba liberou todo o material disponível e permitiu que eu entrevistasse quem quisesse, inclusive mercenários estrangeiros que haviam sido presos após colocar bombas em hotéis e restaurantes turísticos de Cuba e que tinham sido condenados à morte.
Nos Estados Unidos foi mais difícil. Como os agentes do FBI são proibidos de dar declarações públicas, só consegui entrevistas em off. Mas graças ao FOIA – Freedom of Information Act, a lei que regula a liberação de documentos secretos – e após pesquisas nos arquivos da Justiça Federal da Flórida, tive acesso a cerca de 30 mil documentos enviados pela Rede Vespa a Cuba e que haviam sido apreendidos pelo FBI nas casas dos agentes cubanos em Miami. E os serviços de inteligência cubanos me deram uma cópia do megadossiê sobre o terrorismo na Flórida que Fidel Castro entregou a Bill Clinton com a ajuda do escritor Gabriel García Márquez.
Portal Vermelho: Parece-me que o acesso aos cinco cubanos que estão presos nos EUA é bem complicado. As próprias famílias nem sempre conseguem visitá-los. O senhor verificou isso na prática? Conseguiu contato direto com eles?
Fernando Morais: Como não sou parente de nenhum deles nem cidadão norte-americano, não pude visitar pessoalmente nenhum deles. Só consegui autorização para me comunicar com eles por internet. Mas com um limite de 13 mil caracteres por mês. Se as mensagens tivessem mais de 13 mil caracteres, se deletavam automaticamente. Falei também com alguns deles por telefone, pegando carona na franquia mensal de chamadas que suas mulheres e filhos tinham.
Portal Vermelho: Algum deles lhe pareceu um personagem mais interessante?
Fernando Morais: Todos são personagens muito interessantes, acho que daria para fazer um livro sobre cada um deles. Decidi me concentrar em alguns deles, não só por serem os que tiveram desempenho mais, digamos, cinematográfico, mas também por entender que encarnavam de maneira mais ampla o sentido da missão que o grupo desempenhava nos Estados Unidos: infiltrar-se em organizações de extrema-direita da Flórida que estavam patrocinando ataques terroristas contra Cuba. Mas há personagens muito interessantes também, do ponto de vista jornalístico, do outro lado do balcão. Por exemplo, o mercenário salvadorenho que entrevistei em Cuba e que rendeu dois capítulos do livro.
Portal Vermelho: Quem eram essas pessoas que planejavam os ataques a Cuba naquela época? E quem eram os mercenários que os executavam? Faziam só por dinheiro ou havia alguma questão de fundo?
Fernando Morais: Eram organizações de extrema-direita, que atuavam como entidades humanitárias para ocultar seu verdadeiro objetivo. Os mercenários, salvo uma ou outra exceção, como o salvadorenho a quem me referi, atuavam por dinheiro. Mais precisamente, recebiam U$ 1,5 mil por bomba colocada em Cuba.
Portal Vermelho: O senhor acredita que esse sentimento extremado dos EUA (Flórida) em relação a Cuba persiste nas gerações atuais?
Fernando Morais: Os tradicionais inimigos da Revolução Cubana, os autodenominados anticastristas verticales, estão morrendo ou já estão muito velhinhos. Quando eu terminava o texto final do livro, por exemplo, morreu Orlando Bosch, que era considerado o inimigo número 1 de Fidel Castro.
Ainda é possível ver em Miami manifestações de rua contra a Revolução, mas as novas gerações parecem mais interessadas em ouvir salsa do que em colocar bombas. Semanas atrás, por exemplo, o cantor cubano Pablo Milanés fez um espetáculo em Miami. No ginásio onde cantou, ele foi aplaudido de pé por 15 mil pessoas. Na rua, meia dúzia de velhinhos carregavam cartazes de protesto contra ele.
Portal Vermelho: Esse esquema de cubanos infiltrados em Miami conseguiu impedir ataques de fato?
Fernando Morais: Sim, não só impedir dezenas de ataques como permitiu a prisão de dezenas de mercenários estrangeiros que atuavam a soldo de anticastristas de Miami.
Portal Vermelho: O que o seu livro traz de mais revelador?
Fernando Morais: A maior parte das informações contidas no livro é inédita. Além de documentos secretos obtidos em Cuba e nos EUA, e da entrevista exclusiva que fiz com o mercenário salvadorenho Raúl Ernesto Cruz León (na época condenado à morte em Cuba por ter colocado bombas em hotéis e matado pessoas), o livro traz revelações inéditas de bastidores políticos a respeito da correspondência secreta trocada entre Fidel Castro e Bill Clinton – e cujo intermediário era o Prêmio Nobel da Paz Gabriel García Márquez.
Portal Vermelho: O livro vai mesmo virar filme?
Fernando Morais: Sim, os direitos de adaptação para o cinema foram vendidos para o investidor cultural Rodrigo Teixeira. Aliás, foi com o dinheiro recebido que pude custear parte da pesquisa, já que se tratava de um trabalho caro, que envolveu cerca de vinte viagens a Cuba e aos Estados Unidos.
Portal Vermelho: O senhor já tinha escrito sobre Cuba antes. Como vê a Ilha hoje?
Fernando Morais: Vejo com grande otimismo. As mudanças econômicas postas em prática pelo presidente Raúl Castro são, na verdade, correções de erros cometidos nos primeiros anos pós-Revolução, quando o radicalismo não tinha limites. Mas confesso que não vejo perspectivas de mudanças políticas significativas enquanto perdurar o bloqueio dos Estados Unidos contra Cuba.
Portal Vermelho: O senhor vê alguma possibilidade de indulto para os cubanos que ainda estão presos nos EUA?
Fernando Morais: Se o presidente Barack Obama se reeleger, no ano que vem, pode ser que ele indulte os presos. O ex-presidente Jimmy Carter se comprometeu a pedir a ele que faça isso. Mas enquanto Obama precisar dos votos da Flórida, majoritariamente cubanos, não há a menor chance de isso acontecer. Essa expectativa vale igualmente para a revogação do bloqueio, medida que também tem como defensor o ex-presidente Carter.
Portal Vermelho: Li que o senhor deve escrever sobre o governo Lula. Pode adiantar alguma coisa sobre esse projeto?
Fernando Morais: Por enquanto não há nada decidido. Creio que nem ele nem eu sabemos exatamente o que pode nascer desses encontros iniciais. Só sabemos é que não deverá ser uma biografia do Lula.
Serviço:
Lançamento de Os últimos soldados da Guerra Fria e debate “Os 5 cubanos ignorados pela mídia”. Com Fernando Morais, Lázaro Mendes Cabrera e Socorro Gomes.
Quinta-feira, 20 de outubro, às 19h
Teatro da FAPCOM
Rua Major Maragliano, 191
Telefone: 3154-1829
São Paulo / SP
O músico e política de subjugação nacional
Rosa Minine
Bandolinista, letrista e compositor e de choro e samba, Pedro Amorim é acima de tudo uma pessoa convicta quanto à importância da música popular, aquela que tem função transformadora junto a uma população, trazendo em si suas referências culturais e a própria identidade de um povo, para uma sociedade.
Professor de Educação Física nascido no Rio em 20 de julho de 1958, Pedro estava ainda na faculdade quando começou a se envolver com música. Na época, era apenas um 'passatempo' para ele. Sem a menor intenção de se fazer músico profissional, ele se iniciou no bandolim em 1978. Autodidata, cinco anos depois se profissionalizava como instrumentista (bandolim, violão-tenor, cavaquinho, banjo e violão). Adotando o bandolim como instrumento principal, passou a integrar o grupo carioca de música instrumental Nó em pingo d’água, com o qual gravou João Pernambuco / 100 anos, seu primeiro disco.
— Eu nem sabia que tinha talento para a música. Um dia comprei, de um homem na rua, um bandolim horroroso. Encordoei e comecei a tirar músicas de ouvido. Nunca mais parei de tocar. Passei a compor tão logo comecei a tocar, sempre dentro do universo do choro, samba — explica.
Parceiro de Paulo César Pinheiro, Wilson Moreira, Nelson Sargento, Maurício Carrilho e Délcio Carvalho, Pedro ainda trabalhou quatro anos como professor de Educação Física, até se dedicar exclusivamente à música. Ao longo de 22 anos de carreira, ele tem se apresentado pelo Brasil e exterior — França, Dinamarca, Japão — e realizado pesquisas sobre a música brasileira, além de acompanhar importantes músicos e intérpretes, como: Elizeth Cardoso, Hermínio Bello de Carvalho, Ademilde Fonseca, Moacyr Luz, Olívia Hime e Chico Buarque.
Em 1.993, como solista da Orquestra Sinfônica Nacional, interpretou a suíte Retratos, de Radamés Gnattali, e em Paris gravou o CD O Trio, ao lado de Maurício Carrilho e Paulo Sérgio Santos. Esse disco, lançado no Brasil pelo selo Saci um ano depois, conquistou dois prêmios Sharp de Música: melhor CD e melhor grupo instrumental. Também em 1.994 lançou na Europa e no Brasil o CD Pedro Amorim toca Luperce Miranda. Em 1998 dirigiu e tocou no projeto Revendo Opinião, que reinaugurou o Teatro de Arena de Copacabana, no Rio. Em agosto de 2000, lançou no Japão o CD Arranca-toco, gravado com Maurício Carrilho, Jorginho do Pandeiro e Nailor Proveta.
Desde o ano 2.000 Pedro Amorim dá regularmente aulas gratuitas de choro na Escola Portátil de Música, no Rio de Janeiro, ao lado de Maurício e Álvaro Carrilho, Luciana Rabello e Celsinho Silva. Esporadicamente, leciona em eventos no Brasil e outros países. Ele fez parte do grupo de músicos:
— Cirley de Holanda, que na época era coordenadora de música da Funarte — recorda. Ofereceu-nos o espaço para que pudéssemos criar a Oficina de Choro. Mas logo em seguida pessoas ligadas à Diretoria fizeram uma 'molecagem' com ela, fazendo-a sair. Em solidariedade a Cirley, muitos funcionários também saíram. E nós, que ensinávamos choro, tomamos o mesmo rumo.
Em 2.001 a Oficina de Choro passou a funcionar na Escola de Música da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), em função de acordo com o diretor do estabelecimento. Porém houve mudança de diretoria, e os problemas nos levaram a nova mudança, em 2.004. Desta vez fomos ocupar um casarão histórico, no bairro da Glória, no Rio. Adotado o nome de Escola Portátil de Música, as Oficinas de Choro aumentaram. A ampliação do quadro de professores permitiu receber mais aprendizes: atualmente temos 400 matriculados e outros tantos à espera de vaga. O curso é inteiramente gratuito.
Pedro considera paradoxal o fato de grande número de jovens se interessar pelo estudo do choro em tempos nos quais jornais, rádio e televisão desprezam inteiramente esse gênero musical.
— Aquele que ouve o produto massificado que as emissoras de rádio ou televisão apresentam — seja pagode ou o nome que lhe for dado — , sofre uma lavagem cerebral e parece que ficará assim para sempre. Mas no primeiro momento em que tem acesso a música de qualidade, passa a ver que existe um outro universo além daquele, e parte em busca dessa boa música. Assim se formam os pequenos espaços onde a música popular brasileira tem sobrevivido e se expandido.
Pedro lembra que a redescoberta do samba e do choro na Lapa, no Rio, a partir da década de 90, deu-se por acaso: um pequeno grupo de amigos passou a se encontrar lá, para rodas de samba e choro, todos os fins de semana:
— Sem qualquer pretensão, juntávamo-nos num botequim da Lapa. Mas a notícia foi se espalhando. Chegou gente de toda a parte, e o botequim virou ponto de referência. Um comerciante achou bom negócio abrir uma casa no local, e o samba e choro na Lapa virou febre. Tudo sem apoio oficial. Naquela época, a Prefeitura abandonara totalmente a Lapa.
A música que transforma
Pedro Amorim estabelece grande diferença entre a música que o povo canta por imposição do monopólio dos meios de comunicação, mas que nada representa culturalmente, e a que tem raízes culturais, sendo integrante da própria história.
— O monopólio da comunicação pode transformar qualquer coisa em popular. Apresenta um monte de besteiras como única opção e a população, sem saída, passa a cantar aquilo. Assim têm surgido esses subgêneros inventados. Uma análise do pagode, por exemplo, definirá uma balada ianque com instrumentação de samba misturado. Não tem nada a ver com samba. Existe uma outra vertente do pagode, a partir do samba de roda da Bahia. Mas também essa está completamente desfigurada.
— A música popular verdadeiramente cultural é muito forte — observa Pedro. A pessoa escuta e se reconhece no que está ouvindo. Essa música representa culturalmente um país, como o tango para a Argentina, o fado para Portugal. Por isso, quando existe uma invasão cultural como a que acontece no Brasil há muito tempo, por parte do USA, a primeira coisa que os invasores fazem é desfigurar a música, a cultura, porque a forma mais fácil de se invadir é acabar com a cultura de um lugar, que fica sem referência e sem resistência, podendo ser ocupado muito facilmente — continua o músico.
— A música popular que integra a cultura é modificadora. Já aquela imposta pelo monopólio dos meios de comunicação, é imobilizadora; seu efeito é justamente o contrário: alienante. E quando aliena, imobiliza. Mas a música popular integrante da cultura brasileira, o samba, o choro, o calango, o jongo, o maracatu, o frevo, é muito forte. São ritmos que surgiram espontaneamente no meio do povo, brotando de manifestações populares. E muitos são um cadinho, uma mistura, sendo difícil às vezes de se chegar aos ingredientes da formação deles — acrescenta.
Viramos um quintal deles
Pedro diz que a invasão cultural do Brasil pelo USA começou com a Segunda Guerra Mundial e acentuou-se na década de 50:
— A invasão começou ao tempo da política de Boa Vizinhança de Roosevelt, na Segunda Guerra Mundial, quando se consolidou o imperialismo ianque. Com ela, as alianças com os países vizinhos possibilitaram a infiltração da cultura ianque em detrimento da cultura local. Tudo muito bem planejado, e viramos um quintal do USA. Creio que é saudável um contato entre culturas diferentes, de países diferentes, mas quando se destrói a cultura de um país para impor-lhe a cultura de outro, em prol do lucro, os invadidos ficam inteiramente desabrigados.
Pedro entende que mesmo Carmem Miranda (1.909 — 1.955), conhecida como divulgadora do Brasil no exterior nas décadas de 40/50, foi uma arma que eles usaram para deturpar a cultura brasileira:
— Carmem representava o Brasil que eles queriam. E até hoje é assim: artista brasileiro, para trabalhar no USA, item de cantar em inglês, fazer o arranjo que eles acham melhor. Carmem Miranda fazia uns passinhos de rumba e umas coisas para compor a imagem do Brasil que eles queriam mostrar. Não o Brasil do jeito que é.
O bandolinista conta que o compositor e instrumentista genial que fazia os acompanhamentos musicais nas apresentações de Carmem Miranda, Aníbal Augusto Sardinha, o Garoto, representava o Brasil, mas não aparecia:
— Ele a acompanhava naqueles sambas, naquelas marchas que ela gravava, tocando violão tenor, cavaquinho, violão e banjo, mas a imagem que ficava era a da Carmem Miranda. A imagem do Garoto ficava somente para quem era músico ou conhecesse de música. O grande público não sabia nem da sua existência. Enfim, o samba era o samba, mas a imagem da Carmem Miranda não era a do Brasil. Só que o que aparecia era a imagem da Carmem Miranda.
O personagem Zé Carioca, criado por Walt Disney, em 1.941, para simbolizar o Brasil de acordo com a política da Boa Vizinhança também foi, segundo Pedro, instrumento de deturpação da cultura brasileira.
— A Carmem Miranda e o Zé Carioca — afirma convicto representam o Brasil, capital Buenos Aires, que existe até hoje graças aos ianques, que passaram essa imagem para o mundo.
Para Pedro, a invasão cultural ianque intensificou-se durante a ditadura militar (1964 — 1984), que fechou todo o espaço no rádio e na televisão para a música genuinamente brasileira.
— Nessa época surgiu o jabá, expressão usada para suborno de emissoras e funcionários para a difusão de músicas de maior interesse comercial. As gravadoras pagam para a difusão daquilo que bem entendem. Ora, isso é corrupção, crime de lesa-pátria e lesa cultura, que vai reduzindo a capacidade de pensar de uma população inteira.
O bandolinista crê que o espaço ocupado pelo monopólio estrangeiros dos meios de difusão cultural, de onde, há muito, vem sendo expulsa a música genuinamente brasileira e seus músicos, é problema da alçada do Ministério da Cultura do Brasil, mas entende que não há interesse em mudar o quadro atual:
— O cargo de ministro da Cultura deveria ser entregue a alguém que tivesse preocupação com a cultura brasileira. O titular, Gilberto Gil, nunca teve essa preocupação. Eu mesmo lembro uma entrevista na qual disse a um jornal : 'Eu não gosto de samba. Eu gosto é de reggae'.
Pedro Amorim acrescenta que, participando da comemoração do Dia Nacional da Cultura, na Petrobrás, o ministro Gilberto Gil, chamado a apresentar-se, pegou o violão, cantou uma música mexicana e foi-se embora. Para a solução de todo o problema, há que incluir a música popular no currículo das escolas de nível básico, desenvolvendo-se estudo sobre figuras representativas como Pixinguinha, Ernesto Nazaré, Anacleto de Medeiros, Chico Buarque etc., etc.
— Com isso — ressalta o instrumentista — as crianças que chegam na sala de aula com a cabeça cheia de 'lixo', depois de ter assistido programas do tipo Xuxa e genéricos, teriam uma verdadeira opção. Fiz, recentemente, uma experiência pava avaliar o conhecimento de adolescentes quanto à música popular brasileira. Verifiquei que muitos não sabem quem é Chico Buarque. Isto porque nunca ouviram falar, ou já ouviram algum dia, mas não conhecem nada da sua obra. Esses jovens estão crescendo sem lastro cultural musical nenhum.
Para a população não gostar
O instrumentista denuncia o boicote a que o choro é submetido pelas emissoras de televisão, que só o apresentam associado a coisas do passado, embora esse gênero esteja mais vivo do que nunca:
— Se observarmos os grandes compositores brasileiros, desde Villa-Lobos, todos ou vieram do choro ou passaram pelo choro. O Hermeto Pascoal, por exemplo, começou em um conjunto regional, tocando sanfona, e é um compositor de choro magnífico. Tom Jobim foi compositor de choro também, embora muitas pessoas não saibam. Fazem questão de esconder essas informações.
Pedro Amorim destaca que a sabotagem do choro evidencia-se com o acontecido a Raphael Rabello, um gênio do violão que, quando começou a fazer sucesso no rádio e na TV, contratou uma equipe de divulgação, e esta lhe recomendou que jamais pronunciasse no ar a palavra choro, embora todos gostassem daquilo que ele tocava.
— Raphael Rabello tinha um talento incrível para a música instrumental. Nas décadas de 80 e 90 realizou uma série de trabalhos marcantes na história da MPB, e ficou conhecido pela sua habilidade de passear por vários estilos musicais: o choro, o samba, a bossa-nova, o erudito. Mas sua formação era essencialmente em choro. Raphael faleceu prematuramente aos 32 anos de idade, em abril de 1995.
Pedro diz que, como nos dias atuais tudo que é representativo da cultura brasileira sofre censura, mutilação, ou ocultamento, sobra espaço para o trabalho alienante de muita gente. E que há várias maneiras de destruir os músicos brasileiros, numa guerra extremamente desigual, onde muitos músicos desconhecem sua função, o papel tão importante que devem cumprir em defesa da verdadeira música brasileira, popular ou erudita, a começar pelo próprio significado de ser músico brasileiro:
— Muitos músicos e conjuntos musicais dizem que estão fazendo música popular brasileira, aparecem sempre na mídia, mas quando perguntados, sobre seus trabalhos, geralmente dizem que é samba, misturado com funk, maracatu e baião. Porém quando ouvimos, é o mesmo lixo, a mesma submúsica ianque.Do mesmo modo, afirmam ter adotado como exemplo gente como Luiz Gonzaga, Jackson do Pandeiro, Geraldo Pereira, mas quando examinamos seu trabalho descobrimos que é rock, é funk, de efeito alienante. O sucesso é doce, e quase todo mundo quer faze-lo, quer ganhar dinheiro. Muitos desses músicos poderiam até realizar um excelente trabalho, porque realmente têm capacidade, conhecem de cultura, mas é mais fácil encostar e viver a sombra da fama, do que fazer um trabalho sério, mas sem espaço na mídia. O que acontece em muitos casos é que se o músico faz aquela música ruim, mas está ganhando dinheiro, sendo assim, continua a fazer. Porque fazer uma música que seja realmente importante, cultural, dá muito trabalho. Vemos esses programas de televisão de agora, do tipo `Big Brother`, e notamos quantas pessoas querem fazer parte dessa bobagem, para ter seus poucos minutos de fama e a possibilidade de ganhar dinheiro mole. Isso acontece porque o trabalho não é mais valorizado, e de alguma maneira passam para a população a idéia de que é melhor ganhar muito dinheiro com o menor esforço. Isso acontece também na música: trabalhar com música é um negócio muito sério e exige esforço. Só que isso não interessa para muita gente, porque chegam umas pessoas que sabem fazer três acordes com um instrumento, fazem uma submúsica abominável, conseguem sucesso e ganham milhões de dólares. Enquanto isso, aquele que trabalha, vendo que seu trabalho não tem importância, em alguns casos, fica desanimado.
O músico observa que, embora a música brasileira esteja atravessando um período dificílimo, ela tem resistido com toda força:
— Está crescendo a quantidade de gente envolvida com música popular genuína em todos os cantos do Brasil, mas como se fosse em guetos. São pessoas que estão compondo, tocando, e trabalhando com educação musical. Aqui no Rio, a Escola Portátil de Música, faz esse trabalho e já estamos vendo o resultado: jovens que estão compondo, tocando, participando da oficina como monitores, formando grupos de choro.
Apesar de trabalhar com uma educação musical que inclui a leitura de partitura, que é a escrita musical, Pedro diz que dentro das manifestações populares costuma acontecer de músicos geniais não conhecerem nada de partitura, mas que honradamente fazem parte do grupo de resistência da música popular de elevado nível cultural, não tendo menos importância do que aqueles que lêem partitura, porque estudaram teoria musical alguma vez na vida.
— Esse músico ocupa um lugar dentro da cultura musical popular, independente de ler ou não partitura, porque quando ele é bom, é bom. Assim também acontece com a poesia, por exemplo, se observamos um poeta de cantoria popular, que sabe improvisar os versos, vemos que ele possui um vocabulário muito extenso, rico. Tem a capacidade de criar, instantaneamente, versos de uma riqueza lírica, de uma beleza muito grande. Sendo assim, ele não é menos poeta do que o outro que estudou, mesmo que seja analfabeto. A poesia está viva nele. Conhece as palavras e sabe usá-las, assim como o músico que não lê partitura e sabe usar as notas musicais, melodias e harmonias, perfeitamente — explica Pedro.
— A nova geração do choro é composta, em sua maioria, por pessoas que lêem partitura, alguns até com formação universitária em música, mas grande parte dos músicos que tocam choro, até hoje, não conhece partitura. Muitos têm outras profissões para sobreviver e tocam em bares do subúrbio, nas pequenas rodas de choro, em encontros informais nos fins de semana. E isso faz parte da própria história do choro. Consta que os primeiros chorões, no início do século 20, eram funcionários públicos, que se encontravam para tocar com amigos — acrescenta.
— Existem músicos fabulosos que não conhecem partitura, ou conhecem muito pouco desse assunto. Dominguinhos do Acordeom, por exemplo, não conhece teoria musical, pelo menos profundamente, no entanto, ouvimos pessoas que entendem muito de partitura, que lêem e escrevem música maravilhosamente bem, falarem com admiração do seu trabalho, chegando a chamá-lo de gênio e profundo conhecedor de música. Seu trabalho é sempre inovador e de muita qualidade. Continua.
Segundo Pedro, o músico que não lê partitura pode e deve se sindicalizar, não subestimar os seus conhecimentos e ir à luta em defesa de sua categoria e das manifestações culturais verdadeiramente brasileiras e democráticas:
— No momento, o Sindicato dos Músicos do Rio de Janeiro não é forte, mas acredito que a culpa é nossa, dos músicos, porque não devemos abandonar o sindicato só porque ele não está atendendo às nossas questões, mas fazer uma chapa e tentar mudar essa situação. Ele, teoricamente, é um fórum para discussão de matérias ligadas ao músico e nós temos que nos fazer representar. O sindicato não é um 'paizão'. Nós mesmos é que temos que nos mobilizar para defendermos a nossa categoria —, defende.
No momento, além das aulas de choro e as apresentações pelo Brasil, Pedro prepara um disco com músicas que falam de aspectos da cultura afro-brasileira. Esse disco, que deverá sair até a metade deste ano, é resultado de uma parceria com Paulo César Pinheiro, nas letras e nas músicas.
— Eu acho que vou cantar a maioria das músicas, mas o Paulinho deverá cantar algumas também, explica.
Marighella contado em monólogo
Rosa Minine
Nascido em Santa Catarina e residindo em Caicó, na região de Seridó/RN, o grupo teatral Vermelho Núcleo Cênico apresenta pelo país o espetáculo Carlos Marighella e o Chamado de Cangoma, trazendo a público os ideais de um dos maiores revolucionários brasileiros. O espetáculo mostra a pessoa Marighella, seu gosto pela poesia, música e pela liberdade. Sua luta contra o regime militar e a favor da emancipação do povo, tornando-se um dos heróis da história brasileira, mas desconhecido em muitas escolas e universidades.
— Nós, os integrantes do Vermelho Núcleo Cênico, temos uma relação antiga com o teatro. Participamos de vários grupos teatrais, principalmente do ‘Acontecendo Por Aí’, de Santa Catarina, em atividade, do qual fizemos parte por doze anos. Fui diretor de lá e trabalhei todos esses anos com o mesmo elenco. Mas chegou um momento que decidimos que estava na hora de cada um seguir um caminho próprio, isso em 2006, e então nasceu o Vermelho — conta Lourival Andrade, diretor do grupo.
— Somos até agora em três integrantes, todos saídos do ‘Acontecendo Por Aí’, e temos como proposta fundamental montar espetáculos de autores nacionais ou não, dependendo do caso, que tenham um apelo político muito claro, defendendo ideias políticas de transformação relacionada aos trabalhadores — explica.
— O primeiro espetáculo do grupo, em cartaz há três anos, é um monólogo sobre Carlos Marighella.
Apesar da censura à arte
Rosa Minine
Bandolinistas cariocas de grande talento, Déo e Bruno Rian, são exemplos de amor ao Choro que, às vezes, parece que se transfere por gerações pelo plasma sanguíneo. Pai e filho, sempre presentes nas rodas, projetos, discos, shows, lutam pela sobrevivência da música cultural popular brasileira. No seu campo de batalha ainda predomina o grande boicote à arte do povo, comandado pela televisão, rádio e gravadoras no país, em benefício dos jingles e outros ruídos de baixo nível de qualidade, na forma e no conteúdo.
Déo Rian, nasceu em 1944, filho de uma família em que a música sempre esteve presente. Seu pai cantava, o irmão de seu avô tocava cavaquinho, os tios de sua mãe tocavam bandolim e formavam rodas de Choro em casa, desde o começo do século passado.
— Nasci e me criei dentro do Choro e a minha vida musical sempre foi dedicada a ele — declara.
Começou a tocar com cinco anos de idade. Aos quinze passou a estudar música com Moacir Arouca. Com dezoito, tocou pela primeira vez como profissional no rádio, fazendo parte do regional de Darli do Pandeiro.
— O Darli me levou para a Rádio Mauá. Comecei no programa Samba e Outras Coisas, apresentado por Henrique Batista. Lá, encontrei o Jacob do Bandolim e passei a tocar com ele. Depois conheci, na casa do violonista Canhoto, o Dalton Vogeler, produtor da gravadora RCA-Victor, e ele me levou para gravar o meu primeiro disco, em 1969, logo após a morte de Jacob do Bandolim, em 13 de agosto daquele ano — lembra Déo, que faz uma pausa e explica:
— O disco saiu em 1970, contendo somente músicas de Ernesto Nazaret, com o Quinteto Villa Lobos e Quarteto de Cordas da Escola Nacional de Música. Logo, fui convidado pelo violonista César Faria, pai do Paulinho da Viola, para integrar o conjunto Época de Ouro, no lugar deixado por Jacob do Bandolim.
A minha vida musical sempre foi dedicada ao Choro
Déo
Em 1974 gravou mais dois LPs, e dois anos depois o LP Saudades de um Bandolim , relançado em CD pela Revivendo. Déo fez parte do Época de Ouro até 1977.
Conta ele:
— Saí para trabalhar com Clara Nunes em seu espetáculo Canto das Três Raças, por oito meses e depois formei o meu próprio conjunto, Noites Cariocas, com o qual permaneço até esta data. Atualmente, além de mim, o conjunto conta com: um violão de seis cordas, Marcio Almeida; um violão de sete, André Bellieny; no pandeiro, Darli do Pandeiro; e no cavaquinho, Ubiratan.
Lá fora tem
Com o Noites Cariocas, Déo gravou o LP, Inéditos de Jacob do Bandolim , em 1980. Nesse mesmo ano, seu disco Ernesto Nazareth foi lançado no Japão, para onde viajou em 1991, apresentando-se em Tóquio, Osaka, Kioto, Kobe e Nagoya e gravando o CD Déo Rian com Choros e modinhas, acompanhado por músicos japoneses no violão, cavaquinho e pandeiro. Este disco, como tem sido comum acontecer com artistas que cantam a música cultural popular brasileira, foi muito bem sucedido no exterior e jamais lançado por aqui. Devido ao grande sucesso do Choro no Japão, Déo teve que retornar mais duas vezes àquele país.
Em 1993, gravou Raphael Rabello e Déo Rian , apenas com músicas eruditas e, em 1996, o CD Choro em Família , com seu filho Bruno. Sempre lutando em favor do Choro, Déo tem participado de vários projetos de música pelo Brasil e exterior, com sucesso de público.
— Fiz dois shows em Santiago, Chile, com o meu conjunto, e vi o quanto as pessoas ficaram entusiasmadas com a nossa música. O local ficou totalmente lotado nos dois dias que nos apresentamos. Tinha gente sentada no chão, em toda a parte — ele fala.
Não existe mais espaço para a música instrumental no Brasil
Déo
Déo começou a tocar profissionalmente por acaso. Economista, formado pela Faculdade de Economia e Finanças do Rio de Janeiro, em 1976, trabalhou e se aposentou na Embratur — Empresa Brasileira de Turismo. Tocava à noite e nos finais de semana. Quando o conjunto tinha que viajar, geralmente, era substituído por outro músico.
— Os músicos com quem eu sempre convivi eram profissionais, mas tinham outro emprego para sobreviver, porque acreditavam que a música, mais precisamente o Choro, já naquele tempo, não era valorizado, não dando um bom retorno financeiro. Meu pai também me aconselhava a ter outro emprego, e dava como exemplo o Jacob do Bandolim, que com todo o seu nome, nunca pode viver só de música — relata Déo.
Ele repete os conselhos que recebeu de seu pai ao seu filho Bruno:
— Sempre digo a ele que se puder viver só de música, que viva, mas tem que fazer arranjo, dar aulas, proferir palestras, enfim, ser muito versátil, caso contrário não irá conseguir.
Mas, no momento, Bruno está cursando História já sendo formado em administração de empresas.
— Bruno foi criado dentro do universo do Choro. Sempre esteve comigo nos ensaios e shows. Quando bem pequenino, subia no palco com um pente na mão, tentando nos imitar. Não o incentivei a ser músico, mas sempre teve vocação — revela Déo com indisfarçável orgulho.
Filho de peixe...
Apesar dos seus 24 anos apenas, Bruno toca bandolim há quinze e participa, há dez, do conjunto Sarau, que faz as rodas de Choro da Cobal do Humaitá, em Botafogo, Rio, todos os domingos, das 18:30 as 22:00h.
— Esse nosso movimento visa preservar o Choro e a música instrumental. É uma roda que recebe vários músicos, de todos os lugares do mundo, e que virou uma referência para o Choro no Brasil. Já tivemos aqui franceses, japoneses, norte-americanos, que gostam de Choro, aprenderam com brasileiros, tocam em seus países, e vem aqui beber da fonte — lembra Bruno.
O grupo Sarau é formado por Bruno Ryan, bandolim; Carlos Agenor, pandeiro; Sérgio Prata, cavaquinho; e André Bellieny, violão de sete cordas. Declara Bruno:
— Somos um grupo de Choro e tocamos outros tipos de músicas afins, mas com a linguagem dos chorões, porque, antes de ser um gênero, o Choro é uma linguagem, uma forma de se tocar.
O Choro é a minha vida
Bruno
Desde os dez anos de idade, no Rio de Janeiro, Bruno participa de vários projetos, ligados ao Choro. Aos quatorze estreou em disco, gravando o CD Choro em Família , ao lado do pai, em produção independente, e em seguida, passou a integrar o grupo Sarau. Em 1998 excursionou por Santa Catarina como integrante do Camerata Instrumental do Rio de Janeiro, sob a direção do maestro Edino Krieger. Em 1999, gravou com o Sarau o CD Cordas Novas, também produção independente. Em 2001, foi diretor artístico do disco do pai choro choro choro.com.Déo Rian, e nos anos seguintes participou de vários shows pelo Brasil.
Em dezembro de 2002, participou, juntamente com grandes bandolinistas brasileiros, do recital Ao Jacob, seu bandolins, evento que deu origem ao CD de mesmo nome, lançado em 2003 e vencedor do Prêmio Rival BR de Música, no ano seguinte. Em 2004, excursionou pelo interior do Rio de Janeiro, como solista do Época de Ouro, no projeto Um Piano na Estrada, do pianista Arthur Moreira Lima, e participou de homenagens aos bandolinistas Luperce Miranda e Jacob do Bandolim, por iniciativa do instituto Jacob do Bandolim, do qual é conselheiro.
No ano passado, marcou presença na tournê por São Paulo, com o Época de Ouro, shows e oficinas de Choro nos Festivais de Inverno de Friburgo e Teresópolis. No último mês de agosto, Bruno foi um dos solistas convidados pelo flautista Altamiro Carrilho para fazer parte de seu DVD.
— O Choro é a minha vida, o que eu gosto de viver, de tocar. Eu acho um gênero extremamente rico e com muitas possibilidades. Não é fácil tocar Choro, não é fácil — enfatiza Bruno referindo-se à complexidade deste gênero, exatamente por ser uma música extremamente rica, que abre leque para outros gêneros afins.
Muitos músicos e estudantes chegam a afirmar que após tocar Choro com desenvoltura, a pessoa está apta a tocar qualquer outro tipo de música.
Boicote ao Choro
E o amor pelo Choro é maior que as dificuldades enfrentadas pelo músico brasileiro. Déo confirma que viver de música no Brasil nunca foi fácil, mas hoje está muito pior. Os lugares que o músico pode se apresentar, em sua maioria não oferecem contrato nem pagam um valor justo para o músico. Querem que ele trabalhe à base do couvert artístico, que é o valor adicional cobrado, por pessoa, nos bares com apresentação de música ao vivo.
— Há alguns anos se fazia contrato com o músico. Hoje, ele tem que tocar à base do couvert, quer dizer, é o que der. Isso nos prejudica e muito. Eu, inclusive, evito tocar nesses lugares, porque já tive experiência desagradável — expõe Déo.
— No meu início de carreira, os barzinhos com música ao vivo, como hoje, não existiam, mas casas de shows, conhecidas como boates. Por exemplo, a boate Copacabana, com conjuntos de músicos e cantores contratados. Também, há alguns anos, o Choro tocava no rádio, que tinha seus programas do gênero e as suas orquestras contratadas. Músicos como Jacob do Bandolim e Técio Miranda, tiveram programas semanais. A Orquestra Tabajara, na Rádio Tupi, era notícia. Orquestras da Rádio Nacional, também. As rádios tinham os seus artistas. Hoje, não existe mais espaço para a música instrumental no Brasil. A televisão não mostra, o rádio não toca e as grandes gravadoras, de capital estrangeiro, não gravam — declara secamente.
O Choro, antes de ser um gênero, é uma linguagem, uma forma de se tocar
Bruno
— Esse boicote vem desde a década de 60, passando a ser mais forte a partir da de 90. Durante os anos 60 e 70, o nosso espaço começou a acabar no rádio, mas ainda tinha a televisão que mostrava a música instrumental, com suas orquestras. Eu mesmo trabalhei, juntamente com o meu conjunto, na TV Globo por um ano, no programa Alerta Geral. Fiz também participações na TV Tupi de São Paulo — lembra.
E prossegue:
— Do final da década de 80 para cá, a televisão demitiu os seus músicos, e os musicais praticamente acabaram. Alegaram que ficava muito caro e que não dava retorno comercial. Assim, não se vê musicais decentes na televisão brasileira, hoje, quanto mais no horário nobre. Com isso, os espaços para os músicos mudaram, deixando de ser a televisão, o rádio, as gravadoras, as boates, para se transfirirem aos tais barzinhos que tocam à base de couvert.
E logo se anima:
— Mas é claro que nós estamos resistindo, por exemplo, com a gravadora Acari, que tem feito um excelente trabalho no universo do Choro, e com os muitos músicos que gravam de forma independente. Além disso, tem muita gente jovem estudando música e tocando muito, e bem, o Choro. Eles estão com interesse cada vez maior pelo gênero, apesar de, praticamente, não ser divulgado. É que se trata de uma música de qualidade— explica Déo, acrescentando que atualmente tem gravado os seus discos de forma independente, distribuídos durante os shows que faz pelo país e pelo exterior.
Pai coruja, Déo é presença constante nas apresentações do filho, com o grupo Sarau.
— Estou sempre por perto, mas ele faz o seu trabalho e eu faço o meu. Quando me pergunta alguma coisa, aí eu oriento — confidencia Déo que, assim como o filho, tem planos de novos discos e muitos shows, com seus conjuntos, para os próximos anos.
Onde se fala em bandolim e Choro, esses dois estão. No Bandolim de Ouro — uma casa tradicional de instrumentos musicais, fundada em 1929, no centro do Rio-, por onde já passaram grandes instrumentistas, Bruno Rian dá aulas de bandolim, toda quinta-feira.
— Eu sou assíduo freqüentador daqui, desde 1964/65. O meu bandolim, que é de 1966, e o do Bruno, são daqui inclusive — revela Déo com alegria.
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